domingo, 25 de outubro de 2009

Carta - um pouco sobre palavras e amor


Carta - um pouco sobre palavras e amor

Cartas me lembram romances, boas novas e seus mensageiros. Jesus é uma carta de amor, o Verbo, que o próprio Deus escreveu a punho e endereçou aos homens. E dentro desse romance sem igual, nós – falo a cristãos - somos simplórios carteiros, cujos pés são formosos por anunciar esse amor. Não menos importantes na história, pois também somos os amantes e filhos aos quais o Noivo e Pai destinou essa correspondência que cruzou os céus e os tempos até chegar aos nossos pobres ouvidos, e até infiltrar em nossos, outrora, petrificados corações.

Não sei se diante de ti, leitor, já pude justificar minha carta – é o que estou tentando fazer até agora. Permita-me agora escrever uma carta de amor, como se esse computador fosse pluma negra e sua tela meu papiro. Como se o amor estivesse mais perto do que longe, e mais real do que parece... Sinto-me a vontade quando escrevo, as palavras me cercam, protegem-me, estando elas sempre sujeitas não a minha vontade apenas, mas aos meus vivos e involuntários sentimentos, esses, na maioria das vezes, não se sujeitam ao meu querer. Eles são carregados nesse trem de palavras como uma longa locomotiva que percorre os montes e as horas, viajando até encontrar os desejados olhos da menina, a afortunada na qual os sentimentos e palavras se destinam ainda informes na mente do poeta. Cartas... elas sempre são seladas pelo receio por não poder estar ao lado da pessoa a quem as mesmas são destinadas. É como uma falível tentativa de alterar um destino presente, ou um alento para melhor aceitá-lo. A distância entre seres cuja proximidade fez-los um ser somente, que lógica pode explicar essa desventura da vida? Ainda teimo em aceitar mesmo a mais racional das respostas para essa pergunta.

Assim, resta apenas as cartas e seus perfumes de aromas para os olhos, essas narinas sensíveis da alma romântica. Não sei da minha engenhosidade para escrever uma carta, todavia algo me diz em voz sem som, internalizada, incomodando-me e creio que devo começar assim: “Mando a ti minhas palavras que escolhi com o mesmo carinho de quem colheu vistosos e vermelhos morangos. Palavras carregadas desse involuntário sentimento. A elas não existem longos percursos, nem pedras no caminho, elas sabem voar como um pássaro mensageiro, e sem tardar, logo não serão minhas palavras, serão unicamente tuas. Um presente, pois é para ti meu verso. Sabendo disso, implorei ao Senhor Logos seus mais preciosos verbos, os quais são desconhecidos dos dicionários. Palavras mágicas que falam mais do que dizem, e dos desapercebidos roubam lágrimas. Apenas um destes tais verbos mágicos visto aos olhos, corresponde a diversas e milhares de palavras postas em sonetos,cujas métricas não suportam tamanho amor quando visto ao coração.

Tenho comigo alguns bons verbos destes, e te ofereço. Eles são presentes do Senhor Logos, em virtude, são de indescritível valor. Agora peço para que feche os olhos e tente ouvi-los, não há tinta que os transcreva. Tu precisas senti-los, é mágica! Todavia devo adverti-la que para lê-los é preciso conhecer em profundidade a língua dos loucos apaixonados, é importante que se vá a sequidão das lágrimas. Língua de sobremodo mais prefeita que o dialeto dos anjos. Língua que o próprio Senhor Logos trouxe a existência e fez questão de ensinar aos homens que tinham ouvidos para ouvir.

Devo confessar que ainda estou sendo alfabetizado nessa língua, mas já aprendi soletrar teu nome para fazer-te mais perto de mim. Clarice Lispector na tentativa de graduar-se nessa língua, disse certa vez: “A palavra é meu domínio sobre o mundo...” Na verdade, creio que a palavra exerça um domínio sobre mim, pois para aquela capaz de dominar um mundo, com menos esforço dominará um homem. Quero dizer apenas que desconheço a forma de escrever o que sinto por ti, – mau escritor de cartas sou - simples palavras não suportam tanto, então procuro por socorro nas palavras mágicas que o Senhor Logos incumbiu-me de guardar. Deves entender que elas não são escritas com tinta nem presas a mal traçadas linhas, são tatuagens eternizadas nas menininhas dos teus olhos, apenas eles,teus olhos, podem lê-las agora, se assim tu desejares. Só nós podemos soletrá-las e somente só a nós, cabe seu significado. Se fores capaz de acreditar nessas minhas palavras, esse é o sinal vivo que elas existem e não são uma alucinação de minhas loucuras, e já mais real ainda são essas emoções que elas, em sua magia, carregam consigo.

Clarice Lispector entendeu bem a semântica dessa língua quando diz: “Ela acreditava em anjos, por acreditar, eles existiam...” Verdades tornam-se de verdade apenas na mesma medida da nossa fé. Deixa-me tentar ser mais simples... Dou a ti minhas preciosas palavras mágicas, poderosas o bastante para romper o tempo e o espaço criando um caos a olhos de outros, mas uma primavera de morangos a sua destinatária e seu remetente.. O que elas dizem? Não me faça essa pergunta! Depende do que teus olhos vão ler. O destino sujeita-se agora as vontades da destinatária, o mesmo ocorre com o tempo. Bem sei que tenho amado na conjugação do “presente”, afinal, não sabes que o amor sempre é? Pois foi a eternidade a primeira a conjugá-lo dessa forma, e a partir do tempo em diante o homem tem cometido muitos erros de conjugação.

O débil ser humano, não entende que o amor as vezes se cansa e parece em constante mutação... mas nunca deixando se perder o que ele é, e apenas acrescentando, ou crescendo – seja como melhor tu possas entender - mas sem deixar nada no passado. De modo que nada se perde, não se substitui, apenas se uni de forma semelhante a uma construção. Talvez eu me faça entender com um exemplo: Quando falo de um amor que embriaga a alma de dois seres, um homem e uma mulher, mas que outrora, o mesmo amor fazia-se nos moldes esculturais e lindos da amizade entre esses dois seres, uma menina e um menino, refiro-me então ao amor que cresce junto com eles em metamorfose, e já em maioridade expressa-se ainda mais profundo e avassala um ao outro de formas distintas da infância suave entre amigos. Todavia esse amor nunca nem se quer cogitou deixar de ser a amizade de tempos anteriores, nele nada se tira apenas se recebe, por isso nada nele deixa de ser.

Enfim, depois de tudo exposto diante de nós nessa minha, talvez não tão clara, carta. Suspeito que podes até achar que não estou a ser sincero, já me peguei pensando isso também. Concordo em suma com o caro Fernando Pessoa quando o mesmo diz “ ser o poeta um fingidor”. Contudo, dessa forma seja o sonho também um fingimento! Pois ele não é real, estando tão longe da matéria. Dentro do que creio ser real, estão os sonhos junto a muitas outras coisas que não posso ver... “

Essa carta é tão real quanto os sonhos são. Se destina aquela menininha dos olhos, invisível, contudo bem audível, de forma que sua voz é única capaz de ler tais palavras mágicas que o Senhor Logos recitou aos ares e deu a mim em secreto. Essa menina é tão real quanto os sonhos são, ou quanto eu possa acreditar neles... Sobre palavras... sei apenas que de extremo valor são as palavras que nos ajudam a entender quem somos, sem iguais são aquelas que nos ajudam a entender quem Deus é. Sobre amor ... apenas pelas palavras mágicas pode-se escrever em veracidade a seu respeito. Sobre cartas... feitas de palavras postas em seu papel. A carta sou eu, feito de palavras, porém postas em minha carne. Ambos – a carta e eu - apenas meros veículos do Verbo... que as vezes falam palavras de amor.

Castro Lins

domingo, 11 de outubro de 2009

Medidas da alma



Medidas da alma

Bem já não sei de minha alma estatura,
Em salto da planicie cai nos montes;
A vil presa alma escrava alucinante,
Fita o Hades lá dos Andes em loucura.

Vejo ondas fundas tomba os horizontes,
Vi vil morte na vida, mal almejo
Fim das miragens crônicas que vejo,
Imortais mais desta hora, embora de antes.

Trevas traga o poeta triste, espéctro
Jaz a letra erro métrico...soneto
Faz medida da vida a cada metro;

Acenas os poemas imperfeitos
Com despeito patético e enfim tétrico,
Alucinas a rima antes do leito.

Castro Lins

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Prece


Tu ó Deus!
Que nos céus habita,
Diga-me:
Entre milhares e centenas
A estrela mais bonita,
Para que se escreva um poema
A alguém... longe, porém
Ainda posso vê-la...
Poema fez-se o tema:
Um menino amando uma estrela.
No firmamento
Onde distante mora,
Da noite seu enfeite,
Dorme quando acorda a aurora;
Todavia,
Todo fim do dia,
Esse teu filho
Uma estrela namora,
Encantado com tanto brilho
Que pela manhã vai embora.
Ó Deus! Perdoa meu afã,
Entre os ares
Queria voar,
Cruzar lindas estrelas em milhares,
Mas apenas uma beijar.
Deus que anda sobre os mares,
Ensina-me sobre o céu caminhar.
Deus meu!
À distância e o amor
São de mesmo tamanho;
Deus! Bom pastor,
Ouve este do teu rebanho;
Teu doce favor
Aquele de repente...
Dedo teu, o céu balança.
Sonho meu, a estrela cadente.
E vindo...
Eu possa sempre tê-la,
E quando sorrindo... ela
Ainda terá brilho de estrela...
Estrela bela,
Sol, mesmo longe aquece.
Assim seja Querido Deus!
Essa é minha prece...
Castro Lins