CRISTO
UMA CRISE NA VIDA DE DEUS
de
Jack Miles
Resenha
por Rafael de Castro Lins
UMA CRISE NA VIDA DE DEUS
de
Jack Miles
Resenha
por Rafael de Castro Lins
O paradigma que o autor evidencia para posterior formulações e teses, tem como base a o processo de transformação sofrido por Deus no decorrer dos tempos a partir das literaturas canônicas judaico – cristãs, e mais especificamente na transição de personalidade entre o Deus dos exércitos até o Cristo crucificado, ou seja, a passagem imprescindível do forte para o fraco. Deus é apresentado ao seu povo, Israel, após a saída do Egito, como Deus que é senhor de toda terra e maior que todos os outros deuses, não somente um deus nacional, isso porque a enormidade de sua força derrotou os egípcios – o mais poderoso império conhecido - em favor do seu povo escolhido... É importante a ressalva que esse sentimento de triunfo sobre as outras nações foi introgetado coletivamente em Israel. As conquistas militares do povo israelita demonstram o caráter personificado do seu Deus.
A forma que o povo encara seu Deus passa a sofrer um processo de mudança iniciado a priori nos momentos de exílios. Quando as conquistas cessaram e todas as expectativas e esperanças voltadas para o Deus dos exércitos frustraram-se, fez-se necessário aos poucos uma mudança na face, na pessoa desse Deus. Diante de um contexto que na prática estava além das forças de Israel modificá-lo, a saber, o domínio e poder violento do Império Romano, a ultima saída consistiu na premissa: se a realidade é imodificável, transforma- se então o Deus desse povo para contextualizá-lo sem retirar-lhe seu trono, em outras palavras, já não é por meio da guerra que Deus irá demonstrar ao mundo seu poder, e seu recurso a partir de então centraliza-se na personalidade mansa de Jesus o Cristo, segundo Jack Miles: “uma nova maneira de preservar a dignidade de Deus sem recorrer a guerra. O Deus da guerra está pronto para se tornar o Deus da sabedoria”. Os anseios do povo, dentro desse processo de transição, também se tornam outros distintos à vitória militar, agora são metafísicos tais como salvação, imortalidade da alma. Os heróis literários são vitoriosos não mais pelo viés militar, mas sim pelas suas virtudes, tal como Daniel. Esses são alguns fatores da transição. Todavia essas mudanças do caráter de Deus ganharam ênfase a partir do momento histórico mais favorável por vir, a saber: a destruição do Templo de Jerusalém no ano 70 da era cristã... Momento que emerge a necessidade de uma nova significação para Deus.
O cristianismo é concebido, na verdade, como uma revisão da identidade de Deus, e Jesus como um reparador dos seus erros passados. A restauração principal de Jesus ocorre quando este revoga para os homens a maldição da morte e abre, a partir de então, as portas para a vida eterna. O livro demonstra que Cristo é o resultado mais do que necessário de uma crise que ameaçou o nome, o trono, a credibilidade do Deus de Israel. Jesus é o Deus contextualizado, revisto, reinventado para garantia da vitória sobre o mundo. Jesus abre as portas para uma vitória transcendente que pode de certa forma demonstra a incapacidade de intervenção de Deus na vida real, isto é, mascara um fracasso militar, mas devolve as esperanças quando dirige o seu povo as moradas do seu Reino celeste. Jack Miles nós esclarece a esse sentido magistralmente com suas palavras: “Deus redefiniu a vitória e, ao fazer isso, redefiniu a si próprio”. A mansidão de Cristo contrasta inteiramente com o Deus dos exércitos e essa incompatibilidade provavelmente foi fator determinante para o nascimento de uma nova religião distinta da judaica, onde Jesus protagoniza a frente como o próprio Deus.
Castro Lins