quinta-feira, 17 de novembro de 2011

TEOLOGIA EM FOCO - A Biblía: Uma Biografia

A Bíblia: Uma Biografia

Karen Armstrong
Capítulos 1 e 2

Resenha
Por Rafael de Castro Lins

A premissa que norteia as informações desses capítulos nasce a partir da destruição do templo judaico no ano 70 d.c, pois esse foi um fato desencadeante de diversas escrituras judaicas e cristãs, inclusive da maior parte do Novo Testamento. A religião judaica sofreu ramificações, transformações que após a queda do templo intensificaram-se. Uma dessas reverberações foi o cristianismo que nasce como uma alternativa de interpretação do judaísmo, e vale ressaltar, ainda muito ligado a este. O movimento cristão nasce da necessidade de uma nova leitura das escrituras sagradas judaicas, uma hermenêutica que se aproximasse mais com uma realidade de conflito com Império Romano. Jesus surge e logo é abraçado por um contexto que carecia urgentemente de algo, ou alguém, que substituísse o que outrora foi o centro da religião judaica, a saber: o templo. A religiosidade dos judeus foi alimentada como efeito direto do conflito com Roma, portanto, a concepção de um messias fortificou-se, a expectativa do Reino de Deus foi fomentada, e o produto desse imaginário religioso ardente foi literário, tanto da parte dos cristãos como da parte dos rabinos judeus.


O cristianismo foi uma hermenêutica que se destacou entre tantas outras seitas oriundas do judaísmo, como a própria autora ressalta: “O cristianismo é uma proeza exegética onde toda a história de Israel foi redefinida”. A crença fundada numa tradição é reinventada quando enfim reduz a Torá, o templo e os profetas a uma sombra do Cristo. Enxergar o Cristo nas escrituras sagradas dos judeus foi um método exegético que perdura até os dias atuais e de certo modo fundamenta o cristianismo. Essa revisão da Torá funcionou como meio de legitimação de uma nova forma de enxergar e interpretar Deus, para cristãos e para os rabinos pós queda do templo.


Esse florescimento plural de interpretações nascentes do judaísmo foi tanto, que mesmo não se pode falar de uma única visão cristianizada, na verdade, a vertente cristã se ramificou em diversas compreensões a respeito do Cristo, por exemplo, as igrejas da Ásia Menor estavam desenvolvendo um evangelho de cunho mais apocalíptico distinto, em alguns pontos, da interpretação das outras comunidades. A pluralidade de opiniões que inventaram muitos cristos tem uma fonte comum, mas contextos diferentes. Enfim, cada Jesus era desenhado segundo as demandas que eram distintas em cada comunidade. De certa forma isso ocorre até os dias de hoje, de modo mais intensificado, a partir da reforma protestante quando as escrituras sem restrições novamente estiveram abertas para as mais possíveis interpretações.


Esse livro também esclarece que esse fenômeno de reinterpretação das escrituras sagradas não foi restrito apenas aos movimentos cristãos, os rabinos judeus também estabeleceram sua nova compreensão dos escritos sagrados, e esse novo modo de entender a fé e a tradição também foi aceito por muitos judeus, a Midrash é o principal exemplo dessa nova visão nascida no farisaísmo. Assim estabeleceram-se dois ramos Judaicos conflitando entre si pela verdadeira hermenêutica do AT. Nos meados dos anos 80 e 90 os fariseus tornaram-se oponentes a medida dos cristãos, fato que possivelmente explica a maneira negativa sempre atribuída aos fariseus nos evangelhos. Os dois movimentos se coincidem em alguns pontos de suas interpretações, de modo que tanto judeus como cristãos experimentavam a Shekhinah de Deus tendo como principio maior a compaixão para com seu semelhante. Pode-se supor também que a regra da compaixão seria uma forma de evitar novos conflitos com Roma, evitando assim mais tragédias. Então se tem um paralelo entre rabinos e comunidades cristãs, ambos os seguimentos em uma intensa construção literária e conseqüentemente conflitando entre si. Todavia, é interessante lembrar que esses eram novos escritos, novos testamentos que respondiam as necessidades de um povo violado pelo caos da guerra. Por outro lado, para corresponder como consolo a aquela realidade, muitas vezes, seja por cristãos ou por rabinos, a significação original do texto sagrado necessitou ser sacrificada, ignorada em prol de uma hermenêutica mais coerente as necessidades do povo. Esse também é, por certo, um dilema para teólogos e pastores hoje: ignorar o significado real do texto sagrado para assim atender as necessidades da sua comunidade atual, ou permanecer fiel ao significado original evitando relativizar uma verdade crida como sagrada?


O cristianismo prevaleceu sobre todas as outras correntes do período pós queda do templo, diversos fatores podemos supor para justificar esse fato, a partir desses dois capítulos: Primeiro revisando os escritos sagrados para atender necessidades latentes do povo. Segundo aderindo os gentios sem impor a eles o judaísmo. Terceiro opondo-se fortemente aos movimentos contrários. Quarto definitivamente sua adoção pelo Império Romano.


Castro Lins

Um comentário:

  1. Minha pergunta é: já fez ou viu alguma monografia que abarque o processo de construção da bíblia? Tem alguma opinião sobre o quanto valeria a pena eu me aventurar nessa pesquisa? Sabes se encontrarei bibliografias em português?

    Estou desesperado e com pouco tempo, grato

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