domingo, 25 de outubro de 2009

Carta - um pouco sobre palavras e amor


Carta - um pouco sobre palavras e amor

Cartas me lembram romances, boas novas e seus mensageiros. Jesus é uma carta de amor, o Verbo, que o próprio Deus escreveu a punho e endereçou aos homens. E dentro desse romance sem igual, nós – falo a cristãos - somos simplórios carteiros, cujos pés são formosos por anunciar esse amor. Não menos importantes na história, pois também somos os amantes e filhos aos quais o Noivo e Pai destinou essa correspondência que cruzou os céus e os tempos até chegar aos nossos pobres ouvidos, e até infiltrar em nossos, outrora, petrificados corações.

Não sei se diante de ti, leitor, já pude justificar minha carta – é o que estou tentando fazer até agora. Permita-me agora escrever uma carta de amor, como se esse computador fosse pluma negra e sua tela meu papiro. Como se o amor estivesse mais perto do que longe, e mais real do que parece... Sinto-me a vontade quando escrevo, as palavras me cercam, protegem-me, estando elas sempre sujeitas não a minha vontade apenas, mas aos meus vivos e involuntários sentimentos, esses, na maioria das vezes, não se sujeitam ao meu querer. Eles são carregados nesse trem de palavras como uma longa locomotiva que percorre os montes e as horas, viajando até encontrar os desejados olhos da menina, a afortunada na qual os sentimentos e palavras se destinam ainda informes na mente do poeta. Cartas... elas sempre são seladas pelo receio por não poder estar ao lado da pessoa a quem as mesmas são destinadas. É como uma falível tentativa de alterar um destino presente, ou um alento para melhor aceitá-lo. A distância entre seres cuja proximidade fez-los um ser somente, que lógica pode explicar essa desventura da vida? Ainda teimo em aceitar mesmo a mais racional das respostas para essa pergunta.

Assim, resta apenas as cartas e seus perfumes de aromas para os olhos, essas narinas sensíveis da alma romântica. Não sei da minha engenhosidade para escrever uma carta, todavia algo me diz em voz sem som, internalizada, incomodando-me e creio que devo começar assim: “Mando a ti minhas palavras que escolhi com o mesmo carinho de quem colheu vistosos e vermelhos morangos. Palavras carregadas desse involuntário sentimento. A elas não existem longos percursos, nem pedras no caminho, elas sabem voar como um pássaro mensageiro, e sem tardar, logo não serão minhas palavras, serão unicamente tuas. Um presente, pois é para ti meu verso. Sabendo disso, implorei ao Senhor Logos seus mais preciosos verbos, os quais são desconhecidos dos dicionários. Palavras mágicas que falam mais do que dizem, e dos desapercebidos roubam lágrimas. Apenas um destes tais verbos mágicos visto aos olhos, corresponde a diversas e milhares de palavras postas em sonetos,cujas métricas não suportam tamanho amor quando visto ao coração.

Tenho comigo alguns bons verbos destes, e te ofereço. Eles são presentes do Senhor Logos, em virtude, são de indescritível valor. Agora peço para que feche os olhos e tente ouvi-los, não há tinta que os transcreva. Tu precisas senti-los, é mágica! Todavia devo adverti-la que para lê-los é preciso conhecer em profundidade a língua dos loucos apaixonados, é importante que se vá a sequidão das lágrimas. Língua de sobremodo mais prefeita que o dialeto dos anjos. Língua que o próprio Senhor Logos trouxe a existência e fez questão de ensinar aos homens que tinham ouvidos para ouvir.

Devo confessar que ainda estou sendo alfabetizado nessa língua, mas já aprendi soletrar teu nome para fazer-te mais perto de mim. Clarice Lispector na tentativa de graduar-se nessa língua, disse certa vez: “A palavra é meu domínio sobre o mundo...” Na verdade, creio que a palavra exerça um domínio sobre mim, pois para aquela capaz de dominar um mundo, com menos esforço dominará um homem. Quero dizer apenas que desconheço a forma de escrever o que sinto por ti, – mau escritor de cartas sou - simples palavras não suportam tanto, então procuro por socorro nas palavras mágicas que o Senhor Logos incumbiu-me de guardar. Deves entender que elas não são escritas com tinta nem presas a mal traçadas linhas, são tatuagens eternizadas nas menininhas dos teus olhos, apenas eles,teus olhos, podem lê-las agora, se assim tu desejares. Só nós podemos soletrá-las e somente só a nós, cabe seu significado. Se fores capaz de acreditar nessas minhas palavras, esse é o sinal vivo que elas existem e não são uma alucinação de minhas loucuras, e já mais real ainda são essas emoções que elas, em sua magia, carregam consigo.

Clarice Lispector entendeu bem a semântica dessa língua quando diz: “Ela acreditava em anjos, por acreditar, eles existiam...” Verdades tornam-se de verdade apenas na mesma medida da nossa fé. Deixa-me tentar ser mais simples... Dou a ti minhas preciosas palavras mágicas, poderosas o bastante para romper o tempo e o espaço criando um caos a olhos de outros, mas uma primavera de morangos a sua destinatária e seu remetente.. O que elas dizem? Não me faça essa pergunta! Depende do que teus olhos vão ler. O destino sujeita-se agora as vontades da destinatária, o mesmo ocorre com o tempo. Bem sei que tenho amado na conjugação do “presente”, afinal, não sabes que o amor sempre é? Pois foi a eternidade a primeira a conjugá-lo dessa forma, e a partir do tempo em diante o homem tem cometido muitos erros de conjugação.

O débil ser humano, não entende que o amor as vezes se cansa e parece em constante mutação... mas nunca deixando se perder o que ele é, e apenas acrescentando, ou crescendo – seja como melhor tu possas entender - mas sem deixar nada no passado. De modo que nada se perde, não se substitui, apenas se uni de forma semelhante a uma construção. Talvez eu me faça entender com um exemplo: Quando falo de um amor que embriaga a alma de dois seres, um homem e uma mulher, mas que outrora, o mesmo amor fazia-se nos moldes esculturais e lindos da amizade entre esses dois seres, uma menina e um menino, refiro-me então ao amor que cresce junto com eles em metamorfose, e já em maioridade expressa-se ainda mais profundo e avassala um ao outro de formas distintas da infância suave entre amigos. Todavia esse amor nunca nem se quer cogitou deixar de ser a amizade de tempos anteriores, nele nada se tira apenas se recebe, por isso nada nele deixa de ser.

Enfim, depois de tudo exposto diante de nós nessa minha, talvez não tão clara, carta. Suspeito que podes até achar que não estou a ser sincero, já me peguei pensando isso também. Concordo em suma com o caro Fernando Pessoa quando o mesmo diz “ ser o poeta um fingidor”. Contudo, dessa forma seja o sonho também um fingimento! Pois ele não é real, estando tão longe da matéria. Dentro do que creio ser real, estão os sonhos junto a muitas outras coisas que não posso ver... “

Essa carta é tão real quanto os sonhos são. Se destina aquela menininha dos olhos, invisível, contudo bem audível, de forma que sua voz é única capaz de ler tais palavras mágicas que o Senhor Logos recitou aos ares e deu a mim em secreto. Essa menina é tão real quanto os sonhos são, ou quanto eu possa acreditar neles... Sobre palavras... sei apenas que de extremo valor são as palavras que nos ajudam a entender quem somos, sem iguais são aquelas que nos ajudam a entender quem Deus é. Sobre amor ... apenas pelas palavras mágicas pode-se escrever em veracidade a seu respeito. Sobre cartas... feitas de palavras postas em seu papel. A carta sou eu, feito de palavras, porém postas em minha carne. Ambos – a carta e eu - apenas meros veículos do Verbo... que as vezes falam palavras de amor.

Castro Lins

domingo, 11 de outubro de 2009

Medidas da alma



Medidas da alma

Bem já não sei de minha alma estatura,
Em salto da planicie cai nos montes;
A vil presa alma escrava alucinante,
Fita o Hades lá dos Andes em loucura.

Vejo ondas fundas tomba os horizontes,
Vi vil morte na vida, mal almejo
Fim das miragens crônicas que vejo,
Imortais mais desta hora, embora de antes.

Trevas traga o poeta triste, espéctro
Jaz a letra erro métrico...soneto
Faz medida da vida a cada metro;

Acenas os poemas imperfeitos
Com despeito patético e enfim tétrico,
Alucinas a rima antes do leito.

Castro Lins

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Prece


Tu ó Deus!
Que nos céus habita,
Diga-me:
Entre milhares e centenas
A estrela mais bonita,
Para que se escreva um poema
A alguém... longe, porém
Ainda posso vê-la...
Poema fez-se o tema:
Um menino amando uma estrela.
No firmamento
Onde distante mora,
Da noite seu enfeite,
Dorme quando acorda a aurora;
Todavia,
Todo fim do dia,
Esse teu filho
Uma estrela namora,
Encantado com tanto brilho
Que pela manhã vai embora.
Ó Deus! Perdoa meu afã,
Entre os ares
Queria voar,
Cruzar lindas estrelas em milhares,
Mas apenas uma beijar.
Deus que anda sobre os mares,
Ensina-me sobre o céu caminhar.
Deus meu!
À distância e o amor
São de mesmo tamanho;
Deus! Bom pastor,
Ouve este do teu rebanho;
Teu doce favor
Aquele de repente...
Dedo teu, o céu balança.
Sonho meu, a estrela cadente.
E vindo...
Eu possa sempre tê-la,
E quando sorrindo... ela
Ainda terá brilho de estrela...
Estrela bela,
Sol, mesmo longe aquece.
Assim seja Querido Deus!
Essa é minha prece...
Castro Lins

sábado, 19 de setembro de 2009

Jesus aplicando EBI*!


Texto Bíblico: Lucas 10: 25-38


Jesus estava a caminho de um certo povoado, onde habitava uma certa mulher chamada Marta ( v38). Podemos supor, que durante esse percurso Jesus tenha sentado-se por alguns instantes sobre a sombra de uma bela árvore. Por que não imaginar que ele e seus seguidores fizeram um círculo para se olharem face a face? E como Jesus era sempre chamado de Mestre (v25), é bem provável que estava na maior parte do seu tempo ensinando. Os ouvintes - pelo menos alguns - eram pessoas íntimas do conhecimento(v25), pessoas cultas ( mestres em interpretar) que não deviam aceitar nada sem questionamento. Alguns com motivações duvidosas(v25), mas não se pode negar o interesse destes em conhecer mais sobre aquele homem intrigante. De repente eis o nascer de um diálogo e alguém do grupo levanta o braço com o dedo apontado para saciar sua questão: Mestre que farei para herdar a vida eterna?(v25)

Através do diálogo, Jesus naturalmente inicia seu estudo com uma pergunta de observação das escrituras: Que está escrito na Lei? Dando seqüência ao estudo, Jesus agora faz uma pergunta de interpretação das escrituras: E como interpretas?(v26). E como as perguntas de observação são sempre as mais fáceis, é só observar o que está escrito: “Amarás o Senhor, teu Deus de todo teu coração, de toda a tua alma, de todas tuas forças e de todo teu entendimento; e: amarás teu próximo coma a ti mesmo”(v27). Ironia Jesus pedir uma interpretação para uma autoridade em interpretar, um interprete da Lei. O mesmo, tentando justificar-se, fez uma nova pergunta: Quem é meu próximo?(v29). Jesus na posição de dirigente do grupo, resolveu usar um método de EBI criativo e propôs um historinha relacionada ao cotidiano da época e a realidade do seu grupo.(v30-35 )

Por fim, Jesus na intenção de trazer seu estudo para um âmbito pessoal da vida do grupo, termina seu estudo com um pergunta de aplicação pessoal quando integrada com a seguida resposta: "Qual destes três parece ter sido o próximo do homem que caiu nas mãos dos salteadores?"

E o intérprete responde: "aquele que teve de misericórdia com ele."

E como sempre ocorre no fim dos EBIs, sempre tem uma recomendação, citação, ou uma frase que confronta e nos faz refletir na vida, Jesus Diz: “Vai e procede tu de igual modo”.

Castro Lins



* EBI - Estudo Bíblico Indutivo. Método de Estudo da Bíblia muito utilizado em grupos da ABU (Aliança Bíblica Universitária) nas universidades.

domingo, 9 de agosto de 2009

As Estrelas Nos Lembram






Em lugares ausentes da história, antes dos limites do tempo sobre a vida, quando a face dos seres era uma imagem do desconhecido... Em terras do nada, lugar esse onde tudo é apenas imaginação... Como árvores de natal sem enfeites, não havia estrelas penduradas no céu... Antes do sol nascer pela primeira vez - talvez se a imaginação assim desejasse, haveria uma lua invisível sem astro algum para iluminá-la... Existiam seres, talvez humanos, talvez reais, seres que moravam na escuridão, cujos olhos eram bolinha inúteis imergidas nas trevas. Já diziam que os olhos são a janela da alma e a cegueira é apenas a alma que não reconhece a luz. Eles não conheciam a luz, pois não havia dia e o que chamamos de noite eles chamavam de vida.



Não! Mesmo assim, os olhos não eram em tudo inúteis, afinal, por eles a alma chora e manifesta quase em palavras, mas apenas em lágrimas, sua solidão. Caminhar e viver são dois nomes dados a mesma pessoa. Caminhavam sem sentido, pois seus olhos eram virgens que nunca conheceram a luz, todavia, posso imaginar que o simples ato de caminhar denuncia uma procura, ou posso usar forçosamente a palavra “esperança”? Sim, creio que devo usá-la. Porém, uma tímida esperança apenas, e nada mais.



Até que um dia... Não! Esse termo é mentiroso, pois até então não existia dia. Vou tentar novamente: até que... a imensidão escura se desfez diante de um imensurável ser que rasga o horizonte, pondo-se no céu como um rei e sentando-se em seu trono suspenso nos ares. A luz passa a habitar no mundo e caminhar entre os homens num encontro inevitável com os olhos... agora os cegos vêem! E os sonhadores aprenderam a olhar para o horizonte! O assombro de um recém-nascido fugido do escuro do ventre da mãe é ínfimo diante da admiração daqueles que deslumbravam petrificados o nascer do dia, esse visitante desconhecido. Peço encarecidamente um simples exercício de empatia: imagine-se como ser da noite que nunca contemplou a aurora da manhã, nem sequer uma chama a clarear, e de repente depara-se com o primeiro nascer do sol.

Outrora obscurecidos os homens não enxergavam sua face no espelho, apenas tateavam os rostos uns dos outros, era impossível reconhecer a si ou a alguém, mesmo próximo. Contudo, quero agora falar apenas do primeiro dia em que houve dia. Tamanha a alegria, o céu e o mar foram pintados de azul e as pessoas conheceram o infinito, muito além do limite da imaginação onde seus sonhos tateavam. Nesse dia o perfume das flores fez mais sentido. Nesse dia o homem conheceu as montanhas e viu-se pequenino. Nesse dia os olhos aprenderam a olhar nos olhos, e o amor nasceu forte como em pleno meio-dia. Houve vida até o entardecer. Até que... O gigante se moveu e parecia ser engolido pela terra, para alguns, porém, mergulhava no mar. A escuridão sem fim tragou a luz e cegou os olhos de todos. Com o cair da noite, o sol que nasceu parecia aos poucos padecer... morto, foi sepultado e se pôs.


Naquela noite a escuridão fez-se mais escura, e o medo postou-se mais visível. Peço novamente apenas mais um exercício de empatia: imagine-se perante a primeira noite, incerto se o dia outra vez nasceria. Talvez seja como o caso do cego que outrora contemplou o belo e suas cores, todavia hoje há apenas imagens de lembranças misturadas com saudades do que se foi. A humanidade caiu na incerteza do amanhã. Quando a noite não tem fim, não existe amanhã.

Eles choraram amargamente, mas alguns não deixaram desfalecer sua esperança. Nas trevas seus olhos não esqueciam a luz, como se o sol nunca houvesse se posto em suas almas. Outros, porém, viram na escuridão que os cercava um simples reflexo de suas almas enegrecidas. Eles amaram mais a noite do que o dia. Esperança é esperar quando o coração já possui o que se espera, mesmo ainda esperando. O que se espera é que venha plenamente o que já se tem em parte. O dia nasceu para aqueles que já tinham o seu brilhar em si e Deus fez deles estrelas, brilhando na escuridão, para lembrar os homens que a noite não é eterna, mas finda, e que o dia logo vem.


As gerações passaram e as estrelas ainda brilham, mas encantam a poucos. O sol nasce todas as manhãs como se fosse a primeira vez, mas poucos o aplaudem. Contudo, devemos convir, que o pôr-do-sol ainda é belo o bastante para roubar lágrimas. A saudade ainda acompanha todo entardecer, e quando escurece... já não sabemos mais a quem porventura se destina a saudade. Ouso perguntar: saudade do desconhecido? Sem demora, ouço a voz das estrelas a responder: “sabes apenas... saudades de Deus!” Enfim, não se angustiem a esperar – as estrelas nos lembram – breve o sol vai nascer.


Castro Lins


Num mundo em trevas, falar de estrelas nunca é bastante, sempre é essencial. Ofereço a vós, estrelas, em forma de consolo, essa tão simples - ou até mesmo infantil - historinha. Devo esse textinho a uma amiga bem distante dos meus olhos, mas bem próxima do meu coração, nunca duvidei do seu brilho... do sempre amigo... Castro Lins

.E falou-lhes pois Jesus outra vez dizendo: Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará em trevas, mas terá a luz da vida

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Escultura



Não escondas o rosto,
Assim da vida...
Retiras...
Todo o gosto.
És obra esculpida,
És arte escultura,
Sou artista
Em loucura,
Desejando ser arte,
Tinta e versos
Para encontrar-te.
Apenas perto;
Apenas parte;
Parte da tua moldura.
E por amor
Que poeta criador
Não se faz criatura?
Mesmo Deus fez-se homem,
Escritor,
Ao mesmo tempo escritura.
Teus olhos
Dois sóis,
Puras, brancas nuvens,
Limpos lençóis.
Orquestra dos céus
Sua mansa, doce,
Límpida voz.
Os cabelos teus:
Mar negro,
És a mais perfeita
Criatura de Deus
Feita em segredo.
Sorria...
Teu mover de lábios
Encanta, embriaga,
Enlouquece os sábios.
Choro com ar divino,
Uma lágrima
Mergulha no mar
Faz dele... mais salino.
Tão doce até salgar,
Um beijo...
Enlouqueceria as ondas,
Seria cômico, estranho,
Nem imaginação sonda
Essa quimera,
Quem dera sonho.
Traços de menina,
Banha-se a bailar
Na chuva
Vinho de muita idade,
És videira,
Uva... felicidade.
Afasta-te!
Oh! infame
E vil vaidade.
Não devo tocar-te
Dizer o nome,
O amor fez-me covarde.
Já não há sons no piano,
As notas loucas repetem
Emudecidas: “te amo... te amo”.
Medo de compor,
Oh! minha linda partitura!
Apenas escultor
Que admira, tu safira,
A mais linda escultura.
Castro Lins

terça-feira, 28 de julho de 2009

Carta – Vento que sopra onde quer.





Lembro que quando criança morava num lugar cercado por pés de eucalipto. Logo atrás da minha casa havia uma floresta com macaquinhos saltando de galho em galho, um circo natural cheio de festa para uma criança cuja idade nem me lembro mais. No entanto, lembro do meu pai levando-me para mata com outros homens, para buscar algo que também já não me recordo ao certo o que era... Porém não importava as razões, a aventura iludia-me e seguir meu pai era como seguir um general. Seus amigos formavam o exército e eu era o soldado herói, o mesmo da televisão, apenas um tanto mais baixinho e com uma dezena de coisinhas grudadas em meu cabelo, pereciam uma certa espécie de carrapicho que dava muito trabalho para tirar depois. Nessas horas, minha mãe entrava em cena e arrancava cada coisinha puxando meu cabelo, – doía muito - mas garantia o final feliz da minha aventura na selva, o encontro inevitável com minha feroz imaginação.


Saudades da infância dos sonhos, quando eu ouvia o som assombroso do vento vindo de encontro aos eucaliptos. Orquestra que só os ouvidos refinados das crianças são sensíveis o bastante para degustá-la, definitivamente era lindo e ao mesmo tempo assustador para um pequenino. As folhas caiam em giros no ar e mereciam palmas. Minha mãe, ou talvez minha tia, me puxava pelo braço dizendo: “anda garoto parece bobo olhando para o vento”. Minha imaginação de menino perguntava a minha alma de bobo: “Será esse aquele a quem chamam Deus?” Lembro desse Deus! Falavam dele na reza anual na casa da minha tia, e estava certo que minha avó, cristã protestante, também havia falado nesse ser dito poderoso e grande. Naquele dia parece que fomos apresentados. Eu não tive a coragem de conversar com ele, pois todos diziam que ele era uma figura ilustre, então fiquei um tanto tímido. Também não conseguia enxergá-lo, era como aquele vento que apenas o sentia e ouvia seu choque com as árvores entres ares.

O som do vento entre eucaliptos... creio que o meu primeiro encontro em consciência com meu criador, como se a poesia olhasse para o poeta e dissesse: “oi”. Fora da minha posição de criatura, não sei qual seria a minha reação diante de algo assim. Todavia, agora posso supor os bons sentimentos que me invadiriam se um futuro filho meu, em suas primeiras palavras, pronunciasse um simples: “Papai.”

O tempo em sua obsessão de sempre nos destinar ao fim. Nunca esqueci esses eucaliptos que se foram dando lugar a tijolos e concreto. A rua ganhou asfalto e minha selva tornou-se selva de homens cheia de barracos e bares. Os macaquinhos se mudaram passando a habitar agora apenas em meus sonhos. Pessoas tristes agora moram atrás da minha antiga casa, toda aquela riqueza que eu tanto admirava tornou-se a pobreza que tanto me entristece. As aventuras hoje são desventuras de um homem que senti saudades da infância. Do muro da minha casa já não vejo verde. Agora vejo de olhos fechados, pessoas tentando esquecer de sua vida sem sentido, sem vento a soprar. Elas embriagam-se e se alucinam. O vento derruba seus barracos e a chuva desaba barrancos e inunda suas casas.

Para que tolos como eu possam lembrar dos antigos macaquinhos, esse lugar hoje se chama “Morro dos Macacos”. Agora homem, vejo que aos poucos o vento parou de soprar, os eucaliptos se foram. Descobri que meu pai era meu padrasto e como eu queria sentir novamente as incômodas coisinhas grudadas no meu cabelo, vendo minha mãe arrancá-las depois de mais uma aventura. Cresci e vi tudo diferente, já não sou leve o bastante para deixar ser levado pelo vento. Fui para universidade para aprender não ser mais criança e perder minha alma de bobo. Hoje corro atrasado entre os sinais de trânsito, e meus ouvidos estão ensurdecidos com a música que a vida me obriga a dançar.

Nesses últimos dias sentir-me sozinho, como de costume, gosto de caminhar em dias de solidão, foram tantos passos para fugir dela que de repente me vi cansado e sentei. E como alguém que estava surdo desde infância, em milagre meus ouvidos se abriram. Assustado como uma criança, eu ouvi novamente o sopro avassalador do vento entre os eucaliptos, logo atrás de mim. Nossa! Era Ele novamente! Deus! Agora, desde aquele dia quando criança, já um velho conhecido. Pai e amigo de outrora que, porém, naqueles dias eu indelicadamente havia esquecido. Ele era o mesmo dos dias passados, tudo se foi: as árvores, os macaquinhos, as rezas, mas ele não.

Percebi que não estava sozinho e nunca estive. Talvez, por horas de anos, eu tenha estado surdo para o som da sua voz que sopra onde quer, e cego para enxergar as folhas caindo das árvores, todavia não estava só. Nem no instante mais insignificante de minha breve vida. Depois da nossa primeira apresentação, agora com um pouquinho mais de intimidade eu conversei com ele abertamente. Foi um bom papo, falei das rezas da minha tia e a gente riu juntos, também choramos juntos quando eu falei das dores das pessoas que moram, hoje, atrás da minha antiga casa.

Aquele era um dia de páscoa, foi inevitável lembrar da cruz e nesse instante, como alguém que desperta de um sono milenar, o vento soprou em meus ouvidos como um sussurro suave: “ Ainda achas que não me importo com a dor dos meus filhos? Ainda pensas estar sozinho?”. Não tive respostas, mas acho que chorei escondendo o rosto das pessoas que passavam próximo a mim. Acho que elas me tinham como louco. Não bastante, lembrei de tantas boas pessoas, que as chamo de anjos, enviadas de Deus para sarar tantas vezes minha solidão. Mas os anjos, diferente de Deus, sempre na hora certa, se vão. Não sei, talvez eles voltem para o céu. Mas deixam conosco algo lá de cima que chamamos de saudades. Não foi por acaso, nem de forma forçosa. Eu simplesmente caminhava pelo Campus me sentido triste, quando ouvir o forte som do vento a cruzar os eucaliptos do ginásio de esportes. Lembrei-me da minha infância, chorei e depois que de todos os sentimentos que contei, sorri e agradeci a Deus pelo seu sopro que desfaz a neblina da solidão e forte o bastante que dá vôo para os anjos com suas asas. Saudades dos bons amigos e de uma amiga em especial a qual dedico essa carta, obrigado pela sua amizade espero não te ver bater asas. Do sempre amigo... Castro Lins