A qualquer momento do dia, meu pai sempre estava pronto para me contar uma de suas aventuras de mocidade. Essas histórias me cativavam de maneira surpreendente, isso até eu completar meus 11 anos.Confesso que eu já não suportava ouvir as histórias repetitivas dos heróis do sertão. Aos 13 anos a televisão roubou o lugar de meu pai e me fez encarar uma cruel verdade: o Superman não é nordestino, e nem se parece com meu pai!
Descobri que as histórias do meu pai se resumiam a brigas de bar (ele sempre batia em todo mundo, e não sofria um arranhão, literalmente, um super homem), ou inúmeras namoradas (ser macho é uma prioridade), e não esquecendo (isso realmente ele nunca me deixava esquecer), de como ele trabalhou para conquistar os poucos bens que nossa família possui.
Um dia me perguntaram: “em tua velhice que histórias você contará aos teus filhos e netos?”
Não vou negar que essa pergunta muito me intrigou, afinal, nunca briguei com ninguém, a única mulher de quem recebo elogios e caricias é minha mãe, e tudo que conquistei com meu trabalho até hoje são apostilas, livros e meus DVDs preferidos.Essa dura realidade me deixou sinceramente preocupado, acho que a aventura mais perigosa que já vivi foi no dia em que entrei de penetra numa festa de aniversário, isso foi realmente emocionante!
Até que um dia... Conheci uma tal de ABU (aliança bíblica universitária), isso sim foi uma aventura!Ao verificar o território não encontrei nenhuma gravata, isso já me deixou amedrontado.Um cara vestido de esportista com um violão nos braços. Pensei: “entrei no lugar errado”. Naquele momento mal podia imaginar que aqueles desgravatados e esportistas se tornariam minha nova família na universidade, mas o processo de adoção não foi tão rápido assim. Eu era muito desconfiado, tinha medo até de comer o lanchinho no final da reunião e se eu não abria a boca para comer, muito menos para falar, porém aquele que pouco fala muito ouvi, muito observa. Sim! Meus ouvidos receberam palavras que por muito tempo estiveram fora do meu dicionário Aurélio: fé, esperança e amor. E uma outra palavra que por muito tempo havia fugido de minhas poesias: amizade.
Entrar na universidade é um sonho, mas quem entra não pode dormir. Realmente não foi, e ainda não é fácil cumprir com meus deveres de universitário.Foi difícil entender meu papel nesse lugar, afinal, por que roubaram meus desenhos animados e me deram um livro de química analítica? Por muitas vezes entrei em depressão. Nas quartas-feiras eu visitava a ABU e de repente alguém começava o estudo perguntando: “você hoje está feliz?” Não era atoa que eu ficava mudo!
Chorei em vésperas de provas, solidão, problemas com os pais, alergias. Inventei novos complexos nunca antes estudados pela psicologia, eu acordava com complexo de Superman e dormia com complexo de inferioridade, apesar de muitas tentativas, eu nunca fui capaz de salvar o mundo, acho que eu precisava deixar Jesus me salvar primeiro.
Por um minuto, a universidade afastou de mim todos meus ideais, minhas paixões e sonhos.
Por uma eternidade, na universidade encontrei a graça de Jesus, outrora perdida em minha vida.
Na universidade conheci a ABU, encontrei muitos amigos, e com eles brinquei, chorei, orei, amei, dentro do alojamento, dentro do banheiro, na fila do almoço ou em qualquer outro lugar*. Vivi tantas aventuras que segundo meus cálculos, meus filhos completarão seus vinte anos e não precisarão ouvir duas vezes a mesma história.
Tanto amor, proezas e medos, tenho pra narrar. Lembro-me de olhar nos olhos dos formandos, no olho esquerdo eu via a alegria de formar, no direito eu via escapar uma lágrima e a tristeza em deixar a ABU... È difícil pensar que logo chegará minha vez.
Sentir Deus, eu sinto em qualquer lugar, mas a ABU é meu lugar predileto. Amadureci atento a cada estudo, quando aprendi a ouvir, comecei falar. Falar de algo novo pra mim e surpreendente: o amor e a graça de Jesus Cristo. Lembro-me também de situações engraçadas: a primeira vez que dancei forró, acredite se quiser, foi na ABU!
Peço paciência para contar minha última grande aventura, o encontro de 50anos da ABUB (aliança bíblica universitária do Brasil) em Goiás.
Um dia olharei nos olhos do meu filho gordinho e perguntarei a ele: “por acaso seu pai já lhe contou a emocionante história das pérolas perdidas?”
Direi a ele, sobre uma divertida viagem de 18 horas do Rio a Goiás.
Cantarei a ele, uma das tantas músicas de louvor que cantamos durantes esse percurso.
Direi a ele, que naquele encontro, meus questionamentos a respeito da miséria e o silêncio de Deus foram respondidos.
Direi a ele, que Deus usou uma missionária da África, como exemplo de entrega e amor ao próximo.
Direi a ele, que existe muitos outros ABUenses espalhados pelos Brasil pregando o evangelho nas universidades e vivendo suas próprias aventuras.
Farei ele rir das boas brincadeiras, principalmente da noite em que nós rapazes ensinamos cada garota a observar as estrelas de uma forma divertida e especial.
Não esquecerei de dizer a ele, sobre a bela e atrapalhada serenata, que nós rapazes fizemos para as garotas em plena luz da lua, e as coreografias... Essas não precisam ser descritas detalhadamente.
Com certeza, ele como todo garoto curioso perguntará: “papai o que aconteceu com as pérolas que estavam perdidas?”.
Direi a ele, que não haviam pérolas perdidas, na verdade, elas sempre estiveram comigo e eu não sabia enxergá-las.
Quando ele estiver quase dormindo, sussurrarei em seus ouvidos uma verdade que aprendi em minhas aventuras: “as mais preciosas pérolas que Deus nos dar: são os amigos”.
Parabéns ABU pelos seus 50anos, não podemos negar as dificuldades da semente, mas também não podemos deixar de experimentar o doce dos frutos. A ciência e a fé que vivemos, escreve uma história de amor e amizade aos olhos de DEUS.
Castro Lins
* trecho da música “grato te sou” própria do grupo ABU-rural. 15/06/07