quinta-feira, 24 de novembro de 2011

TEOLOGIA EM PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA



Teologia em perspectiva sociológica: uma breve passagem pelo Jesus dos evangelhos e a Igreja contemporânea

Por Rafael de Castro Lins




Em uma atenta leitura dos evangelhos e do cotidiano eclesiástico é possível identificar alguns fenômenos sociais estudados pela sociologia. Primeiramente no que diz respeito ao surgimento de Jesus em uma sociedade judaica cuja fidelidade a trama de significados definidos e aceitos em consenso deteriorava-se, os sistemas sociais encontravam-se num processo de não- reconhecimento por certo em virtude do agressivo domínio romano, a partir de então a sociedade começa a fabricar novas expectativas, a fomentar um messias e um novo reino. Esse foi um solo fértil para o nascedouro de Jesus que se apresentava como uma resposta a expectativas sociais e sua conduta proporciona-lhe a identidade almejada do messias, antes tínhamos Jesus de Nazaré, depois do ministério apresenta-se Jesus o Cristo. Acredito que pelo modo como o Jesus dos evangelhos se coloca acima da tradição e da legalidade, pela maneira que apresenta uma nova trama de significados que redefinem Deus e a existência humana e que são aceitos, pois é significativo o número de seus seguidores no decorrer dos tempos, em virtude desses fatores Jesus também pode ser descrito em termos do carisma weberiano.


Ainda que no seu momento inicial o cristianismo mais pareça um processo de alheamento grupal, construindo um submundo com uma cosmovisão própria, todavia logo expandiu e se tornou o novo pressuposto da sociedade. A mudança de significados nos evangelhos é tão clara que enquanto inserido nos moldes tradicionais da sociedade precedente Jesus morre como um criminoso, pois afinal foi crucificado, e após uma mudança, uma redefinição das verdades sociais, Jesus então é apresentado como o Salvador, o Cristo. A sociedade muda e com ela mudam também os nossos heróis.


Por outro lado, como é bem colocado por Peter Berger: “A extraordinária paixão de um movimento carismático raramente vive por mais de uma geração. (...) o carisma reintegra-se as estruturas das sociedades em formas muito menos radicais.” Acredito que talvez a extraordinária paixão do cristianismo tenha sobrevivido mais de uma geração, porém é inegável que este integrou-se as estruturas das sociedades e hoje grande parte sua é apresentada como a instituição chamada igreja que, assim como outros órgãos dessa natureza, padroniza a conduta humana, utiliza sistemas de controle e apresenta seus caminhos desejáveis como única opção plausível. Em termos doutrinários a igreja também é definida em parte por pessoas que já morreram, mas que suas palavras ainda continuam vivas entre nós, em outras palavras mais diretas, a igreja também possui um dispositivo que gera identidade e dispõe aos seus membros um sistema de significados a ser adotado que propiciará uma cosmovisão, uma explicação para sua própria existência e para o mundo ao seu redor. A alternação sofrida pelo indivíduo envolve um rito de passagem que chamamos de batismo, este abre as portas para uma nova identidade gerada e para o ingresso no ambiente eclesiástico. É possível observar que a igreja também possui mecanismos de reconhecimento que sustentam essa nova identidade e a preservam do não- reconhecimento externo, além disso, o grupo de referência eclesial sem dúvidas é decisivo nas opiniões e ações desse indivíduo.


Na verdade não pretendo construir uma mera crítica, apenas estou tentando observar a sociologia na igreja e nos evangelhos, essas palavras são apenas mais uma perspectiva. Particularmente acredito na necessidade das instituições e vejo o nome cristão como um termo que supera o simples papel social, na verdade creio que a fé vaza os papéis sociais e necessita fazer parte de todos estes que formam nossa identidade, para que não haja incoerências em nossas vidas. Nesse sentido a sociologia pode ser importante para o exercício do pastorado, também contribui para abrir nossos olhos sociais para todas as funções manifestas ou latentes que a igreja tem gerado e assim avaliar cada tradição e ideologia e, se preciso for, redefini-las, como fez Jesus. Para que nossa identidade seja conforme a identidade do nosso Deus revelado em Jesus.



Castro Lins

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

TEOLOGIA EM FOCO - A Biblía: Uma Biografia

A Bíblia: Uma Biografia

Karen Armstrong
Capítulos 1 e 2

Resenha
Por Rafael de Castro Lins

A premissa que norteia as informações desses capítulos nasce a partir da destruição do templo judaico no ano 70 d.c, pois esse foi um fato desencadeante de diversas escrituras judaicas e cristãs, inclusive da maior parte do Novo Testamento. A religião judaica sofreu ramificações, transformações que após a queda do templo intensificaram-se. Uma dessas reverberações foi o cristianismo que nasce como uma alternativa de interpretação do judaísmo, e vale ressaltar, ainda muito ligado a este. O movimento cristão nasce da necessidade de uma nova leitura das escrituras sagradas judaicas, uma hermenêutica que se aproximasse mais com uma realidade de conflito com Império Romano. Jesus surge e logo é abraçado por um contexto que carecia urgentemente de algo, ou alguém, que substituísse o que outrora foi o centro da religião judaica, a saber: o templo. A religiosidade dos judeus foi alimentada como efeito direto do conflito com Roma, portanto, a concepção de um messias fortificou-se, a expectativa do Reino de Deus foi fomentada, e o produto desse imaginário religioso ardente foi literário, tanto da parte dos cristãos como da parte dos rabinos judeus.


O cristianismo foi uma hermenêutica que se destacou entre tantas outras seitas oriundas do judaísmo, como a própria autora ressalta: “O cristianismo é uma proeza exegética onde toda a história de Israel foi redefinida”. A crença fundada numa tradição é reinventada quando enfim reduz a Torá, o templo e os profetas a uma sombra do Cristo. Enxergar o Cristo nas escrituras sagradas dos judeus foi um método exegético que perdura até os dias atuais e de certo modo fundamenta o cristianismo. Essa revisão da Torá funcionou como meio de legitimação de uma nova forma de enxergar e interpretar Deus, para cristãos e para os rabinos pós queda do templo.


Esse florescimento plural de interpretações nascentes do judaísmo foi tanto, que mesmo não se pode falar de uma única visão cristianizada, na verdade, a vertente cristã se ramificou em diversas compreensões a respeito do Cristo, por exemplo, as igrejas da Ásia Menor estavam desenvolvendo um evangelho de cunho mais apocalíptico distinto, em alguns pontos, da interpretação das outras comunidades. A pluralidade de opiniões que inventaram muitos cristos tem uma fonte comum, mas contextos diferentes. Enfim, cada Jesus era desenhado segundo as demandas que eram distintas em cada comunidade. De certa forma isso ocorre até os dias de hoje, de modo mais intensificado, a partir da reforma protestante quando as escrituras sem restrições novamente estiveram abertas para as mais possíveis interpretações.


Esse livro também esclarece que esse fenômeno de reinterpretação das escrituras sagradas não foi restrito apenas aos movimentos cristãos, os rabinos judeus também estabeleceram sua nova compreensão dos escritos sagrados, e esse novo modo de entender a fé e a tradição também foi aceito por muitos judeus, a Midrash é o principal exemplo dessa nova visão nascida no farisaísmo. Assim estabeleceram-se dois ramos Judaicos conflitando entre si pela verdadeira hermenêutica do AT. Nos meados dos anos 80 e 90 os fariseus tornaram-se oponentes a medida dos cristãos, fato que possivelmente explica a maneira negativa sempre atribuída aos fariseus nos evangelhos. Os dois movimentos se coincidem em alguns pontos de suas interpretações, de modo que tanto judeus como cristãos experimentavam a Shekhinah de Deus tendo como principio maior a compaixão para com seu semelhante. Pode-se supor também que a regra da compaixão seria uma forma de evitar novos conflitos com Roma, evitando assim mais tragédias. Então se tem um paralelo entre rabinos e comunidades cristãs, ambos os seguimentos em uma intensa construção literária e conseqüentemente conflitando entre si. Todavia, é interessante lembrar que esses eram novos escritos, novos testamentos que respondiam as necessidades de um povo violado pelo caos da guerra. Por outro lado, para corresponder como consolo a aquela realidade, muitas vezes, seja por cristãos ou por rabinos, a significação original do texto sagrado necessitou ser sacrificada, ignorada em prol de uma hermenêutica mais coerente as necessidades do povo. Esse também é, por certo, um dilema para teólogos e pastores hoje: ignorar o significado real do texto sagrado para assim atender as necessidades da sua comunidade atual, ou permanecer fiel ao significado original evitando relativizar uma verdade crida como sagrada?


O cristianismo prevaleceu sobre todas as outras correntes do período pós queda do templo, diversos fatores podemos supor para justificar esse fato, a partir desses dois capítulos: Primeiro revisando os escritos sagrados para atender necessidades latentes do povo. Segundo aderindo os gentios sem impor a eles o judaísmo. Terceiro opondo-se fortemente aos movimentos contrários. Quarto definitivamente sua adoção pelo Império Romano.


Castro Lins

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

TEOLOGIA EM FOCO






CRISTO
UMA CRISE NA VIDA DE DEUS
de
Jack Miles

Resenha
por Rafael de Castro Lins




O paradigma que o autor evidencia para posterior formulações e teses, tem como base a o processo de transformação sofrido por Deus no decorrer dos tempos a partir das literaturas canônicas judaico – cristãs, e mais especificamente na transição de personalidade entre o Deus dos exércitos até o Cristo crucificado, ou seja, a passagem imprescindível do forte para o fraco. Deus é apresentado ao seu povo, Israel, após a saída do Egito, como Deus que é senhor de toda terra e maior que todos os outros deuses, não somente um deus nacional, isso porque a enormidade de sua força derrotou os egípcios – o mais poderoso império conhecido - em favor do seu povo escolhido... É importante a ressalva que esse sentimento de triunfo sobre as outras nações foi introgetado coletivamente em Israel. As conquistas militares do povo israelita demonstram o caráter personificado do seu Deus.


A forma que o povo encara seu Deus passa a sofrer um processo de mudança iniciado a priori nos momentos de exílios. Quando as conquistas cessaram e todas as expectativas e esperanças voltadas para o Deus dos exércitos frustraram-se, fez-se necessário aos poucos uma mudança na face, na pessoa desse Deus. Diante de um contexto que na prática estava além das forças de Israel modificá-lo, a saber, o domínio e poder violento do Império Romano, a ultima saída consistiu na premissa: se a realidade é imodificável, transforma- se então o Deus desse povo para contextualizá-lo sem retirar-lhe seu trono, em outras palavras, já não é por meio da guerra que Deus irá demonstrar ao mundo seu poder, e seu recurso a partir de então centraliza-se na personalidade mansa de Jesus o Cristo, segundo Jack Miles: “uma nova maneira de preservar a dignidade de Deus sem recorrer a guerra. O Deus da guerra está pronto para se tornar o Deus da sabedoria”. Os anseios do povo, dentro desse processo de transição, também se tornam outros distintos à vitória militar, agora são metafísicos tais como salvação, imortalidade da alma. Os heróis literários são vitoriosos não mais pelo viés militar, mas sim pelas suas virtudes, tal como Daniel. Esses são alguns fatores da transição. Todavia essas mudanças do caráter de Deus ganharam ênfase a partir do momento histórico mais favorável por vir, a saber: a destruição do Templo de Jerusalém no ano 70 da era cristã... Momento que emerge a necessidade de uma nova significação para Deus.


O cristianismo é concebido, na verdade, como uma revisão da identidade de Deus, e Jesus como um reparador dos seus erros passados. A restauração principal de Jesus ocorre quando este revoga para os homens a maldição da morte e abre, a partir de então, as portas para a vida eterna. O livro demonstra que Cristo é o resultado mais do que necessário de uma crise que ameaçou o nome, o trono, a credibilidade do Deus de Israel. Jesus é o Deus contextualizado, revisto, reinventado para garantia da vitória sobre o mundo. Jesus abre as portas para uma vitória transcendente que pode de certa forma demonstra a incapacidade de intervenção de Deus na vida real, isto é, mascara um fracasso militar, mas devolve as esperanças quando dirige o seu povo as moradas do seu Reino celeste. Jack Miles nós esclarece a esse sentido magistralmente com suas palavras: “Deus redefiniu a vitória e, ao fazer isso, redefiniu a si próprio”. A mansidão de Cristo contrasta inteiramente com o Deus dos exércitos e essa incompatibilidade provavelmente foi fator determinante para o nascimento de uma nova religião distinta da judaica, onde Jesus protagoniza a frente como o próprio Deus.
Castro Lins

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

IMAGENS




Imagens

Os sábios religiosos antigos acreditavam que espírito (pneuma) era um nome pelo qual os ventos atendiam, quando o espírito de Deus visitava um homem, era semelhante a um sopro, uma brisa, gélida talvez, que tocava a pele e penetrava na alma. O vento só é visto quando as folhas de outono dançam a sua música. Deus modelou o homem e quando decidiu dar-lhe a vida, soprou para dentro dele preenchendo- o com o espírito feito do ar, da respiração que vinha das suas entranhas, como se Deus doasse, deslocasse, o que guardava dentro de si para um novo recipiente chamado de homem.


O ser humano carrega o íntimo do seu Criador, o ser eterno do próprio Deus em seu corpo mortal. As pessoas andam pelas ruas asfaltadas e por entre shoppings e favelas sem imaginar que carregam o âmago de um Deus dentro delas. A crença no mito judaico da gênese, se real, pode mudar o curso da vida do seu crente, pois afeta de maneira direta as relações sociais. Poderíamos criar as mais belas utopias a partir desse credo, em outras palavras, sendo breve, realize: Quando que os assassinos poderiam imaginar que matar o outro, é como matar o Deus presente nesse outrem? Qual a sentença para o assassino de Deus? Imagine a grandeza da ética composta pela seguinte premissa: Praticar qualquer forma de mal a alguém que seja a imagem de Deus, é atentar mal contra Deus. Violentar seu semelhante, que o Senhor a sua semelhança o criou, é como esfacelar, desfigurar a face de Deus. Quem dera, para nós homens, se aquele individuo sujo, faminto, drogado, caído a margem da rua não fosse a representação viva do seu Criador... Quem dera, pois desse modo nossa pena seria mais branda, a responsabilidade seria minúscula. Como imaginar que o Pai de tudo criado tem fome e pede o que comer? E qual espécie de culpa seria essa que diria ao homem: Teu Deus teve fome, e não deste a ele o que comer.

Não há como negar o abalo causado por Jesus nas estruturas políticas e religiosas da sua realidade, e sua morte foi uma resposta, dessa sociedade, a altura do seu impacto social e espiritual. Jesus é o cordeiro de Deus sacrificado pelos pecados de muitos, crença que não nega que ele também foi um protagonista político de importância sem precedentes e procedentes, que o sistema romano achou melhor sacrificar. A crucificação de Jesus ensaia em moldes divinos, o que se repete diariamente em termos humanos. No dia a dia, de igual modo ocorrido com o Cristo, sacrificamos pessoas que são a imagem de Deus por razões políticas, imperialistas, econômicas e hipocritamente religiosas. Sacrificamos seus direitos a dignidade, a educação, a moradia, a fé saudável em favor dos interesses capitalistas, mascarados como sonhos de vida ou como liberalismo econômico, que não são sonhos próprios e muito menos plano de Deus, na verdade nada mais é do que a patologia consumista em padrões religiosos. Ao exaltar qualquer lei religiosa ou financeira, qualquer fim pessoal ou político acima da vida, é o mesmo que posicionar-los acima de Deus. A maneira que uma sociedade, uma igreja ou individuo responde aos direitos humanos mais básicos do seu próximo, diz respeito de modo concreto, a relevância ou posição que Deus ocupa na vida dessa pessoa ou desse grupo. Cada um que morre nas mãos do tráfico de drogas, míngua na fila de um hospital público, é como se Deus fosse novamente fosse açoitado, humilhado e crucificado por motivo do pecado humano, a saber: falta de amor ao próximo.

Todavia a ética judaica da gênese inebria a alma com quimeras que até parecem apontar para outro mundo. Todo ser é uma representação viva de Deus na terra, se real, esse seria o fim que qualquer forma de desigualdade e o início de uma aceitação das diferenciações que fazem de cada um especial ao seu modo. Servir a Deus sempre será tarefa impossível, ou fingida, enquanto o mito da gênese não nos convencer a ver Deus no outro, de modo que amando o próximo é a única forma real de amar a Deus, outra forma distinta dessa, é religião vazia. Se Deus for mesmo encontrado nos olhos dos filhos, na face dos pais, nas mãos do amigo, os relacionamentos por certos sofrerão uma transformação como resultado dessa fé. Aterroriza pensar que cada mal que fiz nessa vida, o fiz contra o meu Deus. Todavia alimenta toda virtude a movimenta o amor pensar que todo bem, cada pessoa que alimentei, cada sorriso que doei, cada palavra amiga ofertada, cada gesto, mínimo ou extraordinário, de amor, o fiz para o meu Deus. Pois o Senhor Deus presente impregnadamente em cada homem teve fome, teve sede, esteve nu, foi preso, e a maneira que reagi a suas necessidades prova o quanto o amo e valida meu cristianismo.

Castro Lins

E criou Deus o homem à sua imagem: à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. Gênesis 1:27

(...) Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; era estrangeiro, e hospedastes-me; Estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me; estive na prisão, e fostes ver-me. (...)
O Rei, lhes dirá: Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes.(...) Em verdade vos digo que, quando a um destes pequeninos o não fizestes, não o fizestes a mim.
E irão estes para o tormento eterno, mas os justos para a vida eterna
Mateus 25:34-46

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

ONDE NASCE A GRATIDÃO?



Essa lógica inconveniente parece clara: A vida se encontra muito além do nosso controle e zomba dos nossos cuidados. Não é difícil convir que exista uma infinidade de motivos e efeitos, causas e conseqüências que simplesmente infligem os mais calculados planos, sem nenhum respeito surpreendem previsões minuciosas e, potencialmente, extrapolam nossas forças. Saiba que o som da existência reverbera uma música impregnada de notas alheias a sua escolha. Uma música rascunhada com rimas e risos, porém, quando enfim perfeita, pronta para ser cantada, de repente... faz chorar! É a vida! E diante desta, o que é o homem senão uma criança?

O que está frente a você é uma falsa sensação de segurança e controle, pois nem toda tecnologia moderna, reunida como um muro de proteção, não é maior do que tsunamis de trinta metros de altura, e toda a supremacia econômica não paga a mínima parte do empréstimo que temos com nosso planeta. A cada dia se constroem mais presídios, mais modernos, mais seguros na certeza que o modo humano de viver é previsível. As universidades nos prepararam bem para o sucesso no mercado, só não avisaram que a vida não é um shopping e as relações sociais não se sustentam apenas na troca.
De repente nos encontramos inevitavelmente fracos, diante de um mundo sobremodo maior do que nossos esforços de proteção. De repente nos encontramos frágeis e sensíveis a toda sorte de possíveis adversidades que são imanentes à vida. De repente nos encontramos como diante de espelhos e nos vemos feios, com nossas imperfeições à mostra. Os pensamentos mais egoístas do íntimo meu, rechaçados em público e os erros que marcam, para que nunca ousemos esquecer que somos seres inacabados. Quando, por fim, nos encontramos incapazes e ignorantes a qualquer falso sentimento de poder... Já não de repente, o caminho por diante é indesviável e a sensação prestes a nascer após um longo tempo de gestação, diz respeito somente a duas palavras, respectivamente nessa ordem, indignidade e posterior gratidão. No coração dos indignos, seu nascedouro, a gratidão é notável.
No momento que a vida se ergue bravia contra nós, e o que resta é a certeza da capacidade e dignidade que nos falta... somos sorrateiramente surpreendidos diante do transcendente que de forma imerecida e não condicionada presenteia- nos com a faceta mais maravilhosa que a vida esconde. A despeito de todo o perigo a de redor, leva- nos por águas tranqüilas e contenta o nosso coração com uma alegria que até então fora desacreditada. Toma para si os nossos sonhos e quimeras e como o ourives manuseia- os para que sejam a mais pura obra de suas mãos. A surpresa diante do inesperado e a felicidade diante do presente imerecido precedem de maneira ultima a real gratidão. Por certo, chorosos de contentamento, caímos abruptamente de joelhos no chão e não haveria outra forma de se pôr, pois toda a beleza contida nesse único “Hoje”, e não bastante, mas cada benção que vem ao encontro de surpresa, ou mesmo o ar que inconscientes respiramos, por certo não é somente resultado final da dignidade ou muito menos de capacidade humana, logo, é milagre! Deus é sua causa primeira.
Fazer de cada bem, de cada momento, de cada realização um milagre sem igual, é a forma mais bela de atribuir a Deus a razão e o destino de toda nossa gratidão! Graças a Ele.



Castro Lins

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

INCONSTANTE




INCONSTANTE

Que é a vida, a criança quer saber?
Oh querida, saudade é a vida
De constante só o atar e o romper,
Hoje és minha doce criança
A criança amanhã é lembrança
E a vida: uma eterna inconstância.

A constância que creio consiste
Na eterna inconstância persiste,
Esse pleno, a saber: não existe!

Todo amor é a lápis gravado,
Felicidade escreve na areia,
A saudade sim, nessa creia!
Que é hoje como é no passado.

A tristeza tem fim, meu pai?
Claro que sim, minha pequena,
Assim como a alegria se vai,
Acaso essa dor seria plena?

Tem pra si o fim a inconstância,
Como ultimo bem e ofício,
Um nome porém, não alcança:
O Eterno sem fim nem inicio.

A constância é o Deus que canta!
Criança, viva a inteira infância
Pois, perguntar não adianta...
Vive, enquanto dure, a constância.

Castro Lins


sexta-feira, 3 de junho de 2011

POEMA OUTRO



Poema Outro

Acordes totalmente outros,
Velados até essa noite outra
Dança triste de outra espera,
Seu som secreto reverbera:

Que bela música é sua voz!
Posso ouvir eternidades
E tudo que possa vir após...

Acordes tocaram meus dedos,
Sou a dança da voz que impera
Suas notas sempre em segredo,
Seu som secreto reverbera:

Que bela música é sua voz!
Posso ouvir eternidades
E tudo que possa vir após...

Em três notas me compôs
Com música apodera, pois
Minha alma, em dança a fizera,
Seu som secreto reverbera:

Que bela musica é sua voz!
Posso ouvir eternidades
E tudo que possa vir após...

A noite se foi e agora acordes
Outros me compõem – deveras
Logo o poema outro transborde...
Seu som secreto reverbera:

Que bela música é sua voz!
Posso ouvir eternidades
E tudo que possa vir após...

Castro Lins