terça-feira, 30 de novembro de 2010

TEMPOS ETERNOS


O solitário é sozinho enfadonho...
O amor cujas palavras a ser lenda,
Hoje simples estória a mais um sonho
Bastante erro para que se arrependa!

O Amor gerado a gerações de outrora,
Agora em bares outras mais estórias
- No tempo a eternidade em uma hora -
Já não passas da glória mais inglória.

Conto - duvido tua veracidade...
Encanto nunca posto a prova antes,
Pois não eras verdadeiro, era a verdade!
Minha eternidade de breve instante;

Enterro o amor nas terras do tempo
- Isso e nada mais és sobre o chronos -
És eterno entre romances que invento...
A história que levas... é o que somos.


Castro Lins

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

EM MEMÓRIA DE MIM





“Olá Castro. Estou com saudade de ti. Lembro que um dia disseste que achas flamboyants floridos muito belos, semana passada vi um. O pior é que pouco a pouco mais e mais dessas árvores vão florir e com isso minha saudade vai aumentar.”
A saudade é estado de ausência que é fome em quem a porta. Emprestei a uma amiga, minha pura admiração pelos flamboyants.
Sem exitar vejo que ela fez dessa árvore um altar, um símbolo que incita a memória humana e traz o passado de volta ao presente: enfim, tem-se uma definição próxima para saudade.
O concreto, outrora inanimado, ganha vida através da metáfora. E a árvore florida perde sua simploriedade comum a todas as pessoas ressaltando, a partir desse instante, um significado novo e único para dois indivíduos em especial.
O flamboyant é o altar que levantamos para relembrar nossa amizade. Todavia o símbolo só faz sentido diante da ausência do que se espera.
É como contemplar a fotografia de alguém que partiu.
De mesmo modo funciona a esperança que existe na perspectiva da vinda, que por vezes é celebrada e vivida antecedendo a chegada. A saudade por sua vez, em termos idênticos, também carece da existência do ausente, remete ao desligamento, ou melhor, ao romper das relações de união.
De modo que cada altar que os homens construíram aos seus deuses, no transpassar da história, é a evidencia mais clara de uma saudade latente entranhada neles...
Saudades do desconhecido, do místico que, antes do misterioso romper, era parte vital desses homens.
E Jesus tomou o pão e dando graças o partiu dizendo:
“Esse é o meu corpo que é entregue em favor de vós. Façam isso em memória de mim”. De igual modo pegou o cálice e disse: “Esse é o cálice da nova aliança feita por Deus com seu povo, selado com meu sangue. Cada vez que vós beberes do cálice, façam isso em memória de mim.”
Fazei isso em memória de mim, disse ele.
Após tais palavras, para aqueles homens, o vinho já não tinha o mesmo sabor, eles passaram a degustá-lo com a alma, e a cada gole a memória instintiva era remetida diretamente a Jesus.
Antes do flamboyant, o pão e vinho prestavam a mim menos significado.
O flamboyant é meu símbolo de amizade e o vinho é a expressão metafísica de uma aliança entre Deus e seu povo. No breve instante do partir do pão e do beber do cálice os Cristãos erguem, onde quer que estejam, um altar que reaviva a memória e seja qual for a relevância do sacrifício de Jesus no passado, agora, é parte da vida dos cristãos hoje, no presente.
A memória humana se alimenta dos símbolos... É o cheiro da chuva que inevitavelmente percorre as narinas e manda um recado para a memória, e por fim lembramo-nos de alguém ou de algum instante. Bastam apenas meros gestos particulares e um magro colo para que alguém reveja sua mãe, estando ela presente ou não. Ou perante a cor da farda militar, que ainda não desbotou na mente dos torturados da ditadura de 64, uma memória mórbida que conduziu muitos ao suicídio.
A memória tem fome de símbolos, e Jesus parecia estar certo disso quando instaura sua ceia santa. O pão é o corpo de cristo, e a única mágica ali presente diz respeito às metáforas e ao mundo dos significados. O vinho é seu sangue e ao mesmo tempo uma assinatura que sela um compromisso, recorda uma aliança!
Reagindo de forma indiferível, sem exceções alguma a diferir, o flamboyant lembra minha amizade de outrora, ou talvez, a aliança cuja matéria que a compõe são promessas cabíveis no universo da linguagem, porém, ainda assim, tais palavras ganham formas concretas de metal conforme um perfeito encaixe nos dedos humanos.
A ceia, assim como o flamboyant ou o cheiro da chuva, para esse que vós escreve, são meus altares. Símbolos sagrados que o homem constrói para aproximar-se do ausente, e ao mesmo tempo celebrar em anseios a sua volta.
Altares nos lembram de quem amamos, imortalizam seus feitos e existem sempre em memória de alguém. Assim o povo Judeu, em suas longas caminhadas, levantava altares para preservar sua gratidão a Deus, essa freqüentemente passível ao ingrato esquecimento.
Cada símbolo é parte intima do que somos e o que não podemos nunca esquecer, portanto, sou um construtor de altares para que a memória não se esvazie dos significados mais ternos como a gratidão, amizade, pessoas amadas, Deus...
O flamboyant é sagrado em memória de uma amizade. O vinho e o pão em memória de Jesus e assim por diante... De forma a aproximar-se do ausente objeto de amor. Sempre em memória de alguém.
Castro Lins





“Até o pardal encontrou casa, e a andorinha, ninho para si, para abrigar seus filhotes; eu, os teus altares, Senhor dos exércitos, Rei meu e Deus meu!” Salmo 84

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

CONSELHO

CONSELHO

“O que diremos, pois, à vista dessas coisas?” As vezes fogem as palavras. Sou um bom escritor impessoal, todavia, quanto mais próximo do meu leitor, mais desmontado fico.
É muito fácil ser distante, descompromissado para com o outro. Tendo em mente esse diagnóstico C. S. Lewis afirma ser o amor, esse em suas diversas facetas, um caminho direto, e por vezes sem volta, para o sofrimento!
Quando criança, eu ingênuo suficiente, a parte de qualquer preservação própria, dava-me empenhado a amar meus amigos e pais irrestritamente sem saber que estava fadado a dar de cara com o sofrimento... Diante dessa surpresa inconveniente, passei a odiar o amor pela sua forte ligação ao desespero e dor...
Fui castrado dolorosamente desse sentimento vil decidido a não mais sofrer.
De repente, no beliche do meu quarto de internato, sozinho, senti que alguém corajosamente abrira as partas do amor. Tentei adverti-lo do sofrimento por vir, mas ele não me deu ouvido e ousou amar-me consciente de toda a dor que isso lhe causaria. Ele me amou primeiro, e amou até o fim... até a cruz. Nada em troca me pediu, nada de ide ao mundo, nem a igreja. Somente Vinde... Vinde a mim... Vinde de novo... Vinde... e eu o atendi!


Sempre, inclusive hoje, temo o amor e estou certo que ele não faz sentido, pois enfim, como diria Camões: “ele é contrário a si...” e no seu decorrer depara-se com a dor conseqüente, mas já não importa: “é dor que dói e não se sente.”

Instantes dizem que algumas pessoas conseguiram desvendar o segredo do amor, vou contar-lhe não porque resolvi o enigma, narro apenas o que ouvi dizer: O amor e a dor são entrelaçados, todavia para raros, o amor cresce tanto... que a dor assim, mais parece um detalhe que afeta e machuca no entanto não detém, pode ferir mas não mata, aviva. Nessa fase o amor é posto na balança junto ao sofrimento e o desnível da balança nos diz que a dor é um preço mais que justo para o amor...

É sobre a cruz que lhe falo em metáforas! A cruz abominável pelos homens foi apenas um preço justo e pequeno diante da Salvação e do plano inequívoco de Deus. A cruz é parte da história como conseqüência inerente a um amor sem igual, todavia ela não é o fim... é somente parte.

Enfim... conselhos chateiam quando muito longos. ... Quero apenas que lembres que não importa os esforços seus para amar alguém, tudo que é verdadeiro nasce em atentar aos repetitivos: Vinde... Vinde... Vinde... Esse é o segredo mais público que conheço. Vai! Esse é meu conselho.


Castro Lins

sábado, 28 de agosto de 2010

SE EU MORRESSE AMANHÃ




Se eu morresse amanhã,
O esquecer seria pleno,
Quem nesta triste manhã
Fecharia meus olhos ao menos?




Bruma de saudade sem valor,
Quem essa frágil criança mata?
Diga em que peito bateria amor,
Herdaria quem minha rasa falta?



Salvo as saudades de minha mãe,
A que coroas mais eu estaria preso?
Meu céu incolor, amigos, irmã e
O amor que trata-me em vil desprezo?




A mísera pena que não te iluda,
Quisera eu morresse amanhã,
Seria a dor cruenta enfim muda
Por sopro gélido em febre terçã.




Eu, se mesmo morresse amanhã...
Podes tu adornar primaveras,
Podes tu flori minhas quimeras,
Tu, compor a vida menos vã?




Seria o passado o que não era
E que não foi, o que se espera
Dar-me-ia uma esperança sã?



Amanhã se morresse eu
Aprenderia a tecer alvas manhãs,
Vestidos de aurora em pontos de lã...
Repouso terno no colo de Deus.




Levaria aos céus algum adeus?
Não sei! Pois se amanhã eu morresse,
Seriam tristes mais os dias dos meus?
Nem lágrimas ou ais levaria desses!





Futuro que seria não pode ser,
Seria se eu não morresse amanhã e
Se não - oh Deus- seria capaz de morrer!


Castro Lins

terça-feira, 24 de agosto de 2010

O Quinto


O Quinto

Não desconsiderando as justas exceções, causa curiosidade saber que as lágrimas quando derramadas, provêem, quase alcançando uma constante, de dores da alma. Sua origem, salvo casos raros, sempre emerge internamente sem manifestação visível, a priori, no corpo do indivíduo; ou melhor: não são os ferimentos ou doenças dolorosas as principais razões do choro humano... Não ocorre o mesmo com as crianças cujos berros são inegáveis diante dos machucados, comuns, após as freqüentes travessuras. O ser adulto aprendeu engolir o choro da dor referente ao corpo, mas sua alma ainda é como uma criança chorona sem causa.

É assim... poucas foram a vezes que chorei por que realmente sentia dor em meu corpo, todavia, muitos foram os momentos que o meu corpo chorou vendo a dor da minh’alma. Devo confessar que quase sempre ao chorar, pude identificar um personagem, outrora oculto, fazendo parte determinante do conflito inicial. Qual nome dou a esse ser abstrato de efeitos fatuais? Não sei ainda, porém me ajuda saber que a nossa palavra amor possui quatro significados distintos para qualquer cidadão grego; apenas para termos de informação: cada amor refere-se diretamente a suas traduções respectivas. Para nós, basta saber que um remete ao sentimento de amizade, outro ao de afeto, outro mais a fins eróticos, em estremo resumo consideremos o sexo, e por fim, o quarto em minha cronologia refere-se ao amor do próprio Deus, sublime e absoluto. Minha pretensão última é criar um quinto amor, que diz respeito aos outros quatro, porém ainda distinto em alguns aspectos.

O Quinto é o amor fadado ao esquecimento, exilado nas periferias dos nossos sentidos, pois afinal, sua existência carece proporcionalmente do insucesso, da não correspondência, dos outros quatro amores. Esse é o ser responsável pelas lágrimas, tão comuns, de nossas almas. Fazendo uso de uma simplória analogia grego - cristã: considera-se o Hades (lugar de sofrimento) como uma resultante de um falível plano cujo fim é o Paraíso, isto é, o Inferno não existe, ao menos a princípio, esse nome ganha significado apenas em detrimento da possibilidade do Paraíso que se perdeu. O que realmente existe é um Paraíso com defeito, incompleto, um plano sem sucesso. Assim, se um plano de amor frustra-se, o efeito imediato é o surgimento de outro amor de natureza contrária a aquele que lhe deu origem. Se o homem considera esse amor primeiro perfeito, ou próspero no sentido de um desejado objetivo para ser alcançado, o amor segundo, resultado de um plano sem êxito, conota a imperfeição, ou a prosperidade duvidosa, ou ainda, se o inicial satisfaz e remete a beleza e felicidade, esse posterior sempre vai causar uma reposta de insatisfação, feiúra e seu hospedeiro vem a ser mais um indivíduo infeliz.

Mesmo sendo esse, um sentimento periférico, ele é mais comum do que parece e sua relevância justifica-se no fato que todos os quatro amores correm riscos de desvios do seu destino final, e os amores extraviados são dolorosamente renegados pela imperfeição. Veja, Almeida Garret descreve em versos “O Inferno de Amar”:

Este inferno de amar- como eu amo!
Quem mo pôs aqui na alma... quem o foi?
Essa chama que alenta e consome,
Que é a vida - e a vida destrói -

Como é que se veio atear,

Quando – ai quando se há de ela apagar?


A invisibilidade do Quinto causa curiosidade, afinal sua presença em poemas, músicas, prosas, é de uma freqüência notória. Ouso crer que uma parcela enorme de nossa arte representa formas de expressão dos quatro amores, desde a Capela Sistina drenando entre cantigas populares, poemas líricos e até ainda músicas modernas... Seja em louvor a Deus ou em devoção a Marília de Dirceu, sejam as paixões que compõem marchinhas de carnaval ou um retrato de família, o tema é único: O amor em suas ramificações peculiares. Todavia outra parcela, também considerável, remete apenas ao amor mal correspondido, imperfeito, aquele que gosto de chamar de Quinto. Impressiona a enormidade de músicas modernas, belas ou inaudíveis, que contam de um amor entre o homem e uma mulher que, a parte qualquer sentimentalismo ou exagero, simplesmente não deu certo. Inspiração suficiente para compor a respeito desse, outrora desconhecido, sentimento que é parte da vida e agora razão da morte dos amantes. Lembro dos saciáveis versos de Konstantinos Kaváfis que narram a poesia da mãe a esperar, em vigília, o filho marinheiro; emociona sua prece vã, inconsciente do fato que ele não haveria de voltar. O amor de uma mãe maculou-se diante da morte do filho, e naquele momento ele falha em seu objetivo primeiro, deixa de está entre os quatro amores iniciais e ganha as novas formas de um quinto amor derradeiro e manchado pela falha.

Desejando-se resumir todas essas quatros formas do amor, podemos defini-las apenas como uma tentativa de relacionamento entre o homem e seus semelhantes e, entre o homem e Deus... sendo o primeiro também criado a semelhança de Deus. Assim, assumindo a religião como uma tentativa de religar e instaurar um relacionamento rompido entre o homem e Deus, ela toma pra si as mesmas proporções e finalidades do amor, sendo esta também uma forma outra de amar. O amor tem por objetivo último o relacionamento, a união entre os seres da terra, ou em termos teológicos, entre os seres da terra e os seres celestes. O Quinto todavia, é filho do rompimento desses laços, seja pela morte do filho, ou pelo desdenho do amado, ou ainda, seja pela religião que talvez, traindo a razão da sua existência, deixou um abismo enorme entre Deus e os homens.

A presença do Quinto talvez fuja da percepção, no entanto ela é inegável e bem crível quando considera-se uma sociedade cujo fundamento, inerente ao ser humano, é o relacionamento, ou melhor: o amor, esse que nem sempre desenvolve –se no rumo que deveria e poucas vezes alcança a maioridade, e ainda criança não o deixamos crescer. O que o mundo vive é a meninice do amor. A maneira entranhada que o relacionamento faz-se corporal e parte vital do ser humano, consiste no fato que a dor, em suas piores facetas, está ligada de forma existencial ao rompimento e frustração de tais relacionamentos. Como eu disse antes, as dores da alma são as principais causas do choro humano, tanto que, não seria heresia alguma crer que o inferno (expressão mais detestável de sofrimento) seja apenas o lugar dos relacionamentos desfeitos, inclusive no que se trata ao próprio Deus cuja união, neste lugar, inexiste.

Não quero delongas mais a respeito dessa visível necessidade humana de envolvimento com seus semelhantes. Porém a provável existência, ou minha pretensão de identificar e expor o Quinto, suponho que foram concluídas; talvez não com todos os argumentos que o tema carece... Aliás, minha vivência intensa com esse personagem mórbido, ao longo de minha vida, não me permite duvidar, nem se quer supor que ele é fruto da minha imaginação. Os boêmios apaixonados e poetas certamente concordam comigo, também aqueles que não trocam palavras com quem amam, seja em virtude de desafetos ou por culpa da vil morte. Haveria muitos casos outros se quisesse citá-los, mas... Sem resquício algum de orgulho, nesta tentativa simplória de ler a vida, infelizmente, encontrei essa quinta tradução para o amor.

Castro Lins

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Alma Nordestina


Alma Nordestina

Minh’alma nordestina
Sem rumo no destino...
Sem gancho pralma rede;
Senti sede do nordeste,
Sendo gosto de salobra
Dessa água que me destes.

Minh’alma ser tão boba...
Que lá na vila ninguém negue,
Que ela na vida também segue
O vento como se o visse
E sonha como se vivesse
Cantando igual canário belga
Pelo caminho, a mais de légua.

Havia um caminho numa pedra
E pura água numa rocha,
Que dura o tempo de uma seca
E a seca o tempo de uma vida;

Minh’alma cheia inxirida
Quer a chuva e o céu também,
Pois é do céu que a chuva vem:
O céu é mar pra quem se ilude,
Pro nordestino o maréaçude...

O céu, rio doce que dá sede;
Minh’alma sede que não morre,
Procura cacimba sem tamanho
E vê no céu o rio que corre,
Te prepara pro frio banho!

E Deus disse com sotaque:
“No céu tua sede eu pus,
Mate ela, antes que te mate,
Encha o bucho com Jesus!”
Para se di dele e ele gancho
Firme para armar a rede...
Bebe alma nordestina!
E cessa seca e essa sede.


Castro Lins

segunda-feira, 19 de julho de 2010

BAILE DOS MASCARADOS


Convenço-me que o ensino do meu país, veio a ser apenas mais uma religião travestida em vestes de carnaval. Em termos históricos, devo crer que o desvínculo entre a fé e a educação pode ser considerado recente.


Veio a ser inquestionável, a rica herança do Torá judaico atribuída hoje ao nosso comportamento, estendendo-se até uma infiltração do pensamento grego a escorrer por entre toda filosofia cristã católica que regeu os tempos.

Apesar das viris rédeas da religião cristã, foi imersa a ela e seus templos, o mais rico lugar onde podia-se encontrar as maiores e melhores bibliotecas, grandes mestres e enfim os mais veementes rebeldes institucionais.

A igreja de certa forma formou e alimentou seus piores inimigos, esse é um risco inevitável quando a educação é posta a disposição e acesso como um banquete farto.


Não duvido da destreza de Lutero como mestre, muito menos da sua influência instigadora para inflamar seus alunos, de forma que: um professor possui em mãos a atenção de seus alunos, e saber manuseá-la, é exercer poder...

em virtude, os livros podem ser armas e atitude estopins que contagiam multidões.


Antes de Lutero, creio que houveram muitos outros professores críticos, corajosos o bastante para expor suas idéias, todavia, poucos entre estes, acreditavam em seus ideais ao ponto de arriscar a vida pelos mesmos.

Se as crenças de Lutero eram verdadeiras ou não, não cabe a eu colocar nesse momento minha opinião, porém, fundamentais ou insólidas, verdadeiras ou falsas, importa que ele, Lutero, creu nelas o bastante para contaminar seus alunos e seguidores, a ponto de desafiar um gigante poderoso sistema institucional, a igreja.


Nosso coração é um fabricante eminente de palavras, algumas destas possuem consigo o selo da autoridade, outras são vazias e apenas ocupam os ouvidos, seu ultimo limite. Para as palavras carregadas da autêntica autoridade, o percurso se estende de coração a coração e sua influência na vida do receptor é um mistério que pode desvendar as mais diversas, perversas, ou brilhantes atitudes.

Palavras dessa natureza podem mover uma nação desiludida e instigar seu ódio falecido como uma brasa preste a apagar que de repente, com um pouco do combustível correto, pode erguer uma enorme chama e queimar em nacionalismo e guerras tudo ao seu redor.


As palavras bem ou mal usadas podem erguer holocaustos, amontoar corpos e suas conseqüências são mundiais. Se Lutero desafiou a temida igreja, Hitler desafiou o mundo.


A crença alemã era fundamental ou insólida, falsa ou verdadeira? A moral que carregamos hoje responde bem que o pensamento alemão era de fato atroz e incorreto, porém o que surpreende, é que nesse caso, sobre a influência da palavra, a moral foi desconstruída e posteriormente reconstruída com outros fundamentos, pois enfim, creio que nenhuma consciência dentro do moldes da nossa moral, seria capaz de atrocidades sem um mínimo de remorso imediato.

Uma consciência desvirtuada pelo nacionalismo ou ressentimento de outrora, imersa num contexto social decadente... facilmente se corrompe e posta-se de portas abertas para receber palavras revestidas de autoridade, uma nova moral que justifique seus atos, fazendo- os legais e virtuosamente necessários.

Não existem vilões na sociedade, todos os criminosos encontram um motivo, uma brecha na moral, para justificar seus atos. A maior parte destes, é movida por mentiras perversas travestidas de verdades heróicas, pois quem seria capaz de suportar o peso que consciência investe contra eles? A forma mais suave encontrada foi cauterizar a própria consciência.

As palavras revestidas de autoridades dividem os tempos. Mesmo sendo os romanos os senhores da história, sem temor, Jesus a dividiu numa parte referente ao antes, e outra ao infinito depois que até hoje perdura sem pressa para o fim.

Talvez Jesus tenha vindo a ser mais um iletrado, como muitos entre seus seguidores, ou não; pois enfim, a história parece nos dizer que Jesus conhecia bem a respeito das escrituras sagradas judaicas,

porém não seria um dever de todo judeu conhecer os alicerces da sua história? Iletrado ou não, fato desimportante quando passamos a considerar que as palavras não são feitas apenas de letras. Sem dúvida há um certo poder, inconsciente a nós, mas entranhado entre as palavras.

Relatos transcritos dizem que multidões de judeus e estrangeiros, inclusive gregos pais da sabedoria e militares romanos, todos, seduzidos em encantos com o discurso desse homem que mais parecia, e para alguns não deixava de ser, um Deus.

Os judeus diziam que em suas palavras havia autoridade, de forma em extrema contrariedade se referiam aos Fariseus, escribas e outros religiosos da época, estes, os mais letrados, respeitados por sua santidade em eminência. O que os difere?

Por que multidões de proporção assustadora, que se estendem até hoje, decidiram não dar ouvidos as autoridades religiosas e aos imperadores, estes, cujo poder dava-lhes titulação divina irrevogável?

E ao invés, dão ouvidos e corações a palavras de um judeu maltrapilho, convencido ser o Filho de Deus.

Convém acreditar que palavras não são feitas de letras... a autoridade, de mesma forma, não se constrói com poderio militar, ou qualquer outro tipo de imposição ou medo. Os Césares, Czares entre tantos outros ufanos imperadores, foram meros deuses do medo, cuja a divindade não perdura muito além de suas efêmeras vidas, apenas uma autoridade artificial, muitas vezes imposta contra vontade de seus servos.

A autoridade diz mais a respeito do senhor que simplesmente não impõe seu senhorio, atitude desnecessária, pois a alma humana sabe reconhecer um senhor quando diante de um.


Jesus não levantou espada, nem a sua presença corpórea é necessária para, hoje ainda, arrebatar mais e mais servos, alguns dispostos a dar a vida por Ele... E o que estes homens atuais possuem desse Cristo, agora em seus dias? Apenas suas palavras, tão vivas quanto eu.


Jesus veio trazer uma mensagem nova aos homens, principalmente aos judeus - povo ao qual ele teve maior contato em vida, todavia, mesmo ele, o próprio cristo, adjetivo que remete a Jesus, afirmava que seu propósito não era revogar as escrituras, sagradas aos judeus, e sim cumpri-las.

Escrituras essas: estudadas, lembradas e relembradas para o povo pelos sacerdotes, fariseus, escribas, interpretes da lei judaica... As palavras não foram ignoradas pelos religiosos, eles sempre a repetiam. A lei era ensinada como conduta de vida aos pais, aos filhos e as descendências por vir... todavia, Jesus incontente com o simples falar das escrituras, decidiu vivê-las e cumpri-las.

Jesus encarnou suas palavras e transformou uma religião de letras em pergaminhos, numa prática de vida. Falava de Deus, a quem ousou chamar de Pai, como se esse Deus estivesse sempre com ele, numa proximidade tamanha... dava a entender que ambos eram um somente.

O Senhorio de Jesus era nato, a despeito de milagres, sendo desnecessário qualquer poderio militar. Um mestre que esteve eternamente certo a respeito da mensagem que pregava, a diferenciar-se da religião judaica que naqueles dias, mais parecia um carnaval de máscaras, cujas palavras e a prática de vida tomavam dois extremos inteiramente antagônicos.


Jesus vivia de tal forma o que pregava, que Ele era o próprio cumprir de suas palavras.


Jesus e sua mensagem eram indistinguíveis.

Quão enorme a autoridade e o poder instigador; as pessoas já não sabiam mais prestar ouvidos aos sons feitos somente de fonemas e letras... Relatos marcantes impressionam: "aonde ir, se só tu tens as palavras de vida eterna?"


Repito: estou convencido que o ensino de meu país veio a ser apenas mais uma religião travestida em vestes de carnaval.

Sou um professor tão jovem quanto a mocidade dos meus sonhos, e por alguns breves minutos envergonho-me ao cantar o hino nacional, que se perde em letras imutáveis transparecendo nunca deixar de ser apenas letra, papel e melodia.


A distância entre a realidade e a beleza do hino nacional, é eqüidistante a dos fariseus e suas escrituras sagradas. Em termos menos globais, especificamente, a educação brasileira compra para si esses mesmos reflexos hipócritas, e maquiagens iguais.

Logo faltam a nós educadores os valores a que tanto ensinamos, falta acreditar em nossas próprias palavras e a conseqüente autoridade necessária, para que alguma relevância haja, em qualquer discurso.


Entristece saber que Hitler fazendo uso de sua moral ignóbil, era um melhor instigador do eu, professor, cidadão pós- moderno.

A desesperança e conformismo social dos meus pais passaram para mim, e como uma corrente, de modo despercebido, de repente encontro-me ensinado essa mesma desesperança aos meus alunos, que por sua vez serão pais e deixaram essa herança aos seus filhos.


A educação é mais uma entre as tantas religiões do mundo, vivendo de sombras institucionais, burocracia e ideologias que não são nada além de letra e papel...


Escolho não mais exigir uma integridade de meus alunos, a menos que essa mesma integridade seja parte de mim.


Não ouso pedir para que enxerguem o aprendizado como meio de formação de um caráter cidadão, a menos que meus olhos sejam curados da miopia que ver a educação como um mero trampolim de ascensão econômica, ou de uma busca esquizofrênica do oprimido que, cansado da opressão, vai para escola estudar para torna-se o opressor de amanhã.


Sinceramente só serei capaz vedar a boca do meu aluno diante de um palavrão, simplesmente quando minha vida deixar de ser um, em seu resumo.


O professor que ensina apenas para receber um montante em dinheiro, cria alunos que vão a escola ambicionando somente receber um montante em dinheiro, logo que formados.


Na verdade nunca importou a sociedade no que o indivíduo se formou, mas sim em que formas ele foi formado, em que moldes suas atitudes são desenhadas.


Só quero lembrar que o carnaval não deve exceder a quatro dias.


O baile dos mascarados finda, exatamente quando os meus verbos se fizerem carne, quando eu encarnar os meus verbos, quando eu vir ser o próprio cumprir das minha palavras.

Castro Lins

segunda-feira, 17 de maio de 2010

SINTOMAS







SINTOMAS



Quem és? Não te espero!

Verso zero;

-Sou a morte que acena
Em horror despedida,
Seguirei-te em poemas,
Em versos suícidas;


Verso um.
Meu verso é febrl,
Minha rima ignóbil,
Meu ser pueril;


Fiz das noites alegres
Restos de última posse...
Se sonho delírios em febre,
Acordo em tétrica tosse.



Tosse entre três tremores
Expele frio da pele, suor,
No corpo esconde tumores,
N´alma há chaga maior:


Há ninho de seres nefastos,
Carinho, saudades, e ferrugem;
Há amor, pecados e ratos,
Vermes, mas versos não surgem...


Cético ri, meus sintomas...
Médico diz, incrédulo:
-Tu és enfermo incomum,
Teu mal: Mal do século...
Verso Vinte um.

Castro Lins


















segunda-feira, 10 de maio de 2010

A saber: o amor


A SABER: O AMOR

Dentre todos os demônios que assolam a alma humana, nenhum é tão vil e voraz como o amor. Nem mesmo nas mais obscuras trevas infernais habita um ser tal, que vocifera sua posse pelas almas alheias. Preciso esclarecer, porém, que entre inúmeras máscaras, suponho o amor na sua tradução mais grotesca, em sua face mais hostil... Erguem-se dois gêmeos de tênue distinção, delicadamente confundíveis e a ambos confere atender a todas as vozes, mas pelo mesmo e único nome, a saber: amor. Sei bem que Deus é amor, todavia não duvido que o amor seja um demônio, quando ousa ser deus. Gêmeos quase idênticos em aparência, todavia de natureza oposta, como se a vida e a morte tomasse para si o mesmo nome, apenas para confundir a tolos de repente surpreendidos com a morte, pensando ter encontrado a vida.

O exorcismo foi adotado... usado como forma de devolver aos seus devidos donos suas almas invadidas, apossadas por seres imundos, demoníacos. Por outro lado, o exorcismo foi mais uma palavra corrompida, cujo significado se perdeu nos átrios religiosos... Foi quando o homem usou dele, não mais para libertar, mas tão somente para aprisionar seu próximo numa religiosidade filha de uma hipocrisia diabólica, alienada, que usa do medo profano e da fé sagrada para manipular e oprimir, assim... encontro-me a pensar: o homem é o demônio do próprio homem, pois, enfim, ele mesmo se encarrega em exercer domínio carcerário a pobres almas de outros homens... Lamento, mas a maioria de nós somos possessos por seres infernais, que, todavia, são humanos. Esses, levam vidas à miséria, de forma a envergonhar os verdadeiros demônios tão menos engenhosos... Sociedade possessa! Escrava do consumismo. Riquezas, bens que são senhores de seus donos... Meras marionetes dançantes a passo de um comportamento hermético, amedrontados pelos demônios de vestes sagradas e olhos azuis, estes, fugitivos dos infernos de outrora e, que, habitam hoje em seus majestosos templos construídos a preço da fé desvirtuada.

Pobre de nós, escravos daquele cujo nome ressoa no inferno, a saber: o amor... esse em sua faceta mais vulgar, ser ignóbil! Então o tempo pára, diante da mais inesperada pergunta: Como exorcizar o amor?

Desenterro de minhas lembranças tesouros literários, e vem-me a memória Sierva Maria, uma menina concebida como endemoniada pela igreja e dada ao encargo do Padre Cayetano Delaura, responsável pelos ritos de exorcismo. A certo ponto dessa intrigante obra de Gabriel García Márquez, o padre Delaura perde sua razão, ou talvez até mesmo a fé, e enlouquecido de amor pela menina de alma usurpada, envolve-se numa trama de volúpia, sossego, sacrifício próprio e amor sem medidas. Em virtude do muito amar, creio e ouso convir que talvez o endemoniado dessa história tenha sido o próprio exorcista.

O teatro de Shakespeare, em Romeu e Julieta, tem como personagem oculto o amor em sua forma mais avassaladora e obsessiva. Mais do que uma história de famílias rivais... Romeu, servo impuro do amor: ignora a vida e desrespeita a morte, assim como ordena seu senhor. O mesmo acontece com Julieta, capaz de desejar a morte dos próprios pais sob ordem desse mesmo deus... é no exato momento em que os senhores se confrontam: o amor que passa por cima e escarnece do amor, ou em outras palavras: por amor o homem é movido em direção aos piores atos de desafeto. É sincronicamente quando Romeu, por muito amar a bela Julieta, comete atrozes assassinatos e por fim atende a mais demoníaca ordem de seu deus e senhor: Romeu devoto, comete suicídio. Pelo fato de servir ao mesmo deus, creio que não há necessidade de recontar o destino de Julieta... O amor vem a tornar-se um demônio, onde o pobre endemoniado certamente não negará nenhuma de suas ordenanças, mesmo que consista no degenerado fim, a qualquer vida.

No teatro da vida real, é até mesmo cansativo ver as sombrias tragédias cujo elo do vil assassino e sua triste vítima é um simplório sentimento de afeto familiar, ou erótico. Desde Caim, não há mais surpresa, ou escândalo, ante tantas funestas notícias de morte em família... e, diante dos dias que passam, não há assombro pelo fato do sangue do seu sangue derramado. Pais e filhos, ambos de mãos ensangüentadas. Deve-se prever que o homem aprenda temer o amor, mais do que o ódio.

E como exorcizar o amor? Não sou exorcista, mas me é pertinente acreditar que o menor sempre dá lugar ao maior. É como um Rei que vai a terras distantes, e na sua ausência, seu reino é dividido e disputado por muitos vassalos iludidos, acreditando numa realeza que não lhes é devida. Assim agem os demônios, ratos que só surgem à noturna, quando todos adormecem, porém, num simples aproximar de passos, se escondem alvoroçados. Basta acreditar no retorno do rei para que todos os demônios, sejam estes homens ou qualquer outro tipo de ser, se escondam como meros ratos sujos e assustados.

O amor é um rótulo que pode estar sobre distintos conteúdos, como um único copo que pode conter água para gargantas sedentas ou veneno para anseios suicidas... Uma mera palavra apenas, um título plagiado de conteúdo inverso e vulgar ao original sagrado. Ao falso inapercebido, por vezes inúmeras, foi dado o nome de real, assim, venho a crer que apenas a verdade pode exorcizar a mentira travestida, de igual modo, o exorcista do amor é o Amor somente. Enfim, interessa não duvidar que a plena manifestação de Deus e o disfarce mais encantador do diabo escorrem da mesma insuficiente palavra, a saber: o amor.

Castro Lins

terça-feira, 20 de abril de 2010

CEM SENTI DOR







Amar gosto de desdém,
Desde ser com respondido e
Não com responder alguém;

Amém tira de vê eras,
Só pó desmedir do
Zero ouro do sem o
A mortalha amar de ira,
Ar modelado se vê
Em choque amor tecido,
Em teias ardor Messias,
Salva dor erguido:
Aos céus olhos sempre vias
Amor tear de cruz,
Por tecido com ciente,
Se entrego ou
Ao prego ou vi da
Já anelo a que
Senti dor não faz,
O amor de existi
Por via mar -te mui tu
E de mais...

Amar gosto de desdém,
Desde ser com respondido e

Não com responder alguém.





Castro Lins



sexta-feira, 19 de março de 2010

EXISTÊNCIA EM PROVA




Existência Em Prova



As divinas poesias sagradas, uma vez me disseram: “o amor não acaba!” E se porventura acabar, só me resta crer num engano temporário: o que jaz em seu fim não é o amor, mas sim um engodo, um plágio indistinguível, bijuteria bela aos olhos mais inconsistente ao tempo, enfim, uma ilusão tola.



Talvez o amor, esse ser que nem mesmo a abstração pode apalpar, possa ser, numa tentativa quase falível, compreendido através da história de um jovem, que certo dia encontrou uma vistosa fruta avermelhada... confundida sempre a jóias, por virtude do seu fascínio e beleza exalada aos sentidos, úmida, e penetrante pelos poros da pele sedenta. Sem mais razões além do seu puro encanto, o jovem deu ao fruto um nome: coincidentemente, amor. Dias felizes como aqueles nunca mais ousaram existir, o sabor do amor é como o doce de cupuaçu, e sua cor é tão vermelha como morangos, seu cheiro cheira a chuva em terra árida, após temporadas cruéis de seca. E seus olhos, são estrelas emprestadas durante o dia, a espera da noite para voltar ao céu. O amor é a fruta da eternidade, mas só dá uma vez no ano.



Já era de se esperar... a primavera, cúmplice vil do tempo, se foi. Dias de sequidão e tempestades assombradas, trouxeram o fim para a fruta outrora acreditada como eterna. Apodrecida, a fruta amor acabou, ou será mais crível que nunca veio a existir? “impossível”, respondeu o jovem a si. Seria um tanto insano para ele negar a veracidade do amor, pois o tinha saboreado, tocado a sua face, seu gosto ainda adocicava sua língua. Seria o real assim de tão difícil distinção, ou seria a ilusão tão irreconhecível?



Certamente, nunca mais a chuva exalou seu cheiro de forma impercebida por aquele terno rapaz, suas saudades comovem as estrelas que de tristeza cadente vieram a cair em desconsolo. Ainda apaixonado, o jovem finda seu romance prematuro em pleno inverno seco, diante da saudade dos bons tempos de morangos... Porém num instante que antecede o fim, segundos, não de arrependimento, todavia prestes a convencer-se da doce ilusão... o autor da história de repente lembra que aquele jovem de coração quebradiço, personagem seu, carregava consigo algumas sementes no bolso esquerdo. Após um cômico sorriso, o autor desfecha seu pensamento sem mais rodeios: por certo o amor não acaba, ele é uma fruta que sempre deixa sementes, quando saboreada.
Castro Lins

quarta-feira, 17 de março de 2010

O ÍNSTANTE É BREVE




O Instante é Breve

É simplesmente lamentável não saber ao certo quanto tempo há, antes que a bola de sabão estoure. Sabe-se apenas que o instante é breve. Ela paira no ar, o vento por vezes a leva sem direção, esfera de cores indefinidas, plágio safado do arco-íris; e sem mais tempo para descrições... de repente ela estoura, de forma tão repentina quanto ironicamente esperada. Entre os ares, tão leve quanto breve... Não se deve negar a brevidade da bola de sabão, no entanto, ignorar os sorrisos espantados das crianças, efeito imediato, seria pura injustiça.



Suspeito que a felicidade é curta, de mesmo tamanho que a efêmera existência simplória de uma bola de sabão, num instante desaparece, porém, deixa num rosto infantil a infindável marca de um belo sorriso. Juntaram-se os lábios para um sopro delicado, foi quando Deus soprou nas narinas do homem... Cada vez maior a bola, maior ainda o suspense, o encanto... Quando a bochechas inflam e o ar úmido corre como um rio entre os lábios, as pessoas descobrem o fôlego exigido pela felicidade, ousadia de soprar cada vez mais a despeito do previsível estouro a por vir.



Engraçadas bolas de sabão, fazem rir apenas alguns poucos bobos adultos agraciados, e as crianças de olhos virgens... essas tentam agarrar-las veementemente antes que caiam e estourem no chão. Hoje nós, Senhoras e Senhores, quão mais infelizes, pois enfim, pouco sabemos rir das bolas de sabão da vida, essas mesmas de vã existência colorida, perdemos a graça, a qualidade de rir do ridículo, do transitório belo. Na medida em que a vida amadureceu, nossos olhos, outrora virginais, foram violentamente violados e aprenderam a chorar secas lágrimas que não sabem para onde escorrer. A felicidade dura instantes, ou até metade de instantes irrisórios, merecedores de longa gozação. Essa razão leva as crianças a soprarem uma bola após outra, sem descanso, sem a duvidosa importância com os futuros prévios estouros.


Quanto tempo há, antes que a bola de sabão estoure? Não imagino uma resposta... Vi uma criança a sorrir, apenas isso importa saber.

Castro Lins

domingo, 7 de março de 2010

IPÊ



Jequitibá!
Forte gemido da noite,
Jequitibá!
Vento vozes e açoite...
Jequitibá!
Já cheia a lua caiu,
Jequitibá!
Nascente estéril hostil,
Jequitibá!
Já morta o mar lhe engoliu.
Jequitibá!
Naus noite negra escura,
Jequitibá!
Derramas sombras sangrentas
Jequitibá!
Cai como fruta madura,
Jequitibá!
Tua cor é a noite cruenta.
Jequitibá!
Olhos de sono atormenta,
Jequitibá!
Aurora, o sol logo nasce...
Jequitibá!
Já és Morta a noite que jaz
Jequitibá!
Como se alguém lhe açoitasse,
Jequitibá!
Desconjuntasse a vida tenaz.
Jequitibá!
Lindo claro dia a nascer;
Jequitibá!
A negra noite a morrer...
Jequitibá!
Suas flores por folhas caídas:
Ipê!
Em sou tronco jaz outra vida.
Castro Lins

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

CHEIRO DE CHUVA...


Cheiro de Chuva

És tu que cheiras a chuva...
És tu videiras e uvas...

Campos de sorrisos vastos...
Vem forte vento sul,
Sem dó dobra e deita os pastos,
Doce como cupuaçu...

Cheiro de chuva és tu...

És tu que a chuva cheiras...
Umedece a árida alma,
Bêbada a ávida fauna
Chora vinho em cachoeiras.

Inunda o sertão afunda,
Manga por ser tão linda,
Tomba o sol como pitomba,
Cai e a semente sol vinga...

Foi quando o novo dia nasceu
Pra logo a tarde morrer...
Sede, sinto o cheiro seu,
Chora o céu, volta a chover.

Castro Lins

sábado, 23 de janeiro de 2010

Desceu ao Hades


A professora de português acabara de entrar na sala... Lá vinha ela com seus exercícios chatos sobre orações coordenadas e análise sintática. Fui sinceramente incapaz de perceber alguma utilidade naquelas aulas. Ela passou de mesa em mesa, distribuindo cópias de uma folhinha que conquistou minha atenção pelos versos e minha antipatia pelos posteriores exercícios. Depois daquele dia, guardei comigo aquela folha de A4 por alguns bons anos. Por fim, envelhecida, ela amarelou. Hoje, ao lecionar, vejo-me com o dever inquieto de repassá-la:


Oração Sem Nome


O autor desse poema, quem o sabe? Foi encontrado em pleno campo de batalha, no bolso de um soldado americano desconhecido. Do rapaz estraçalhado por uma granada, restava apenas intacta esta folha de papel:


Escuta, Deus:
Jamais falei contigo.
Hoje quero saudar-te. Bom dia! Como vais?
Sabes? Disseram-me que tu não existes,
E eu, tolo, acreditei que era verdade.
Nunca havia reparado tua obra.
Ontem à noite, da trincheira rasgada por granadas,
Vi teu céu estrelado
E compreendi então que me enganaram,
Não sei se apertarás a minha mão.
Vou te explicar e hás de compreender.
É engraçado: neste inferno hediondo
Achei a luz para enxergar o teu rosto.
Dito isto, já não tenho muita coisa a te contar:
Só que... que... Tenho muito prazer em conhecer-te.
Faremos um ataque à meia-noite.
Não sinto medo.
Deus, sei que tu velas...
Ah! É o clarim! Bom, Deus, devo ir embora.
Gostei de ti... Vou ter saudade... Quero dizer:
Será cruenta a luta, bem sabes,
E esta noite pode ser que eu vá bater-te à porta!
Muito amigos não fomos, é verdade.
Mas... Sim, estou chorando!
Vês, Deus, penso que já não sou tão mau.
Bem, Deus, tenho que ir.
Sorte é coisa bem rara:
Juro, porém: já não receio a morte.



“As mais belas orações de todos os tempos”



É difícil, e ao mesmo tempo curioso, entender o que aconteceu com esse soldado. Quando se caminha pelas veredas do inferno, a última pessoa que esperamos encontrar é Deus. Esse encontro foi no mínimo surpreendente. Estive a refletir um pouco sobre a vida e suas dores: Há um enorme sofrimento, tanto quanto o azul suave do céu, ambos, sobre nós.

A uma certa idade, a criança depois de muito chorar e mesmo assim ser ignorada, cessa o choro e tenta, sozinha, solucionar os seus conflitos. A dor dos escombros de um mundo em pedaços fez muitos enxergarem apenas uma ausência no espaço reservado a Deus. O resgate não chegou, elas tentaram sozinhas sair das ferragens e tratar dos ferimentos da vida. Para muitos envoltos a fatalidades quase infernais, o diabo ou qualquer outro ser que represente uma angústia ou dor, faz-se mais crível que o próprio Deus.


Eu era mais um adolescente brasileiro, perturbado com minhas cotidianas crises depressivas, quando a guerra hedionda violentava as terras do Iraque... Com uma personalidade ainda incompleta, limitado para entender aquilo tudo, eu apenas chorava sobre a beliche do meu quarto de internato. Foi quando decidi, robótico, comparecer àquela inútil aula de português. Entre as orações coordenadas, interessou-me substancialmente aquela “Oração Sem Nome”, de autor desconhecido.


Sei que posso parecer irracional, todavia, por mais irônicas que sejam minhas palavras, estou certo de que, por entre o sofrimento, Deus pode revelar seu amor; e, se fosse diferente, creio não haver necessidade de uma cruz e um Deus pregado nela. Devo convir que Deus não retira de nós em totalidade a dor a qual estamos sujeitos, ao invés, Ele sujeita-se a ela junto a nós, de livre vontade. E, se antes Deus parecia distante, ausente de toda confusão e calamidades que vivemos, a ponto de alguns negarem sua existência... agora, Ele parece próximo, imerso nas mesmas dores, fazendo sua existência tão clara quanto à existência de um Pai protetor em tempos de guerra. Provando a todos que quiserem tocar nas feridas de suas mãos, que Ele é mais que a figura invisível de um fantasma, e tão real quanto eu e minha carne que sofre. Provando Sua presença no escorrer de cada lágrima salgada... Na solidão, talvez a me ouvir na cama de cima da minha beliche.



Havia um filho, criminoso, destinado à prisão, e um pai justo empenhado, até o fim, a manifestar seu amor pelo filho. Ele tinha o poder de interferir nesse destino doloroso do filho e negar a justiça, ou, simplesmente, deixá-lo sofrer justamente pelos seus erros. O pai resolveu perdoá-lo sem reservas, todavia não interferiu nas consequentes aflições recorrentes aos crimes de seu filho. Por fim, de livre escolha, o pai resolve tomar para si o mesmo lastimoso destino do filho; ambos, juntos, foram presos e aguardavam em meio a aflição do cárcere, o dia da justa liberdade. Essa foi a forma pela qual o pai escolheu manifestar seu amor. Não creio que Deus seja limitado demais, frágil ou fraco para deter as sombras do sofrimento, penso apenas na melhor e mais justa forma para manifestar tão eminente amor.

O que o jovem Michael conhecia da vida era apenas uma face deteriorada: os abusos do padrasto, a pobreza, as drogas, o suicídio. Ele, outrora, nunca poderia ao menos imaginar os compassivos negros olhos, de tom semelhante à cor da pele, daquele senhor que conheceu na noite da sua horrível overdose. Após sucessivas dores mórbidas, Michael estava caído, febril, em qualquer calçada, quando o senhor Jonas colocou-lhe em seus ombros largos e o levou para sua casa - um banho quente e também alguns antitérmicos, um forte café e um suave pão. A dor deu a Michael a oportunidade de experimentar o aconchego de um lar onde mora até hoje e, sobretudo, Michael ganhou um pai naquela noite.

A despeito dos jardins e suas flores, sorrisos infantis inspiradores, da esperança bem protegida que guardamos na alma... A despeito do belo, todos os que choram testemunhariam contra minhas palavras se eu ousasse insinuar um pleno estado de felicidade nesta vida; na verdade, o que temos são relâmpagos, clarões de luz numa noite escura e tenebrosa. E, se mesmo assim, houvesse múltiplas razões para sorrir, meu sorriso perderia a cor desbotado pela lágrima de algum aflito. Apenas se vivêssemos numa bolha, isolados da realidade, apenas assim, poderíamos pregar um pleno estado de alegria nesse mundo, mais parecido, no entanto, com um conformismo covarde. Quero dizer que é simplesmente difícil sorrir enquanto muitos choram.

Mesmo que as estrelas nos apontem a felicidade, somos como aquele simplório soldado contemplando o céu de uma trincheira rasgada por granadas. E a seriedade cômica consiste exatamente nesse inferno hediondo, lugar esse onde o Pai reside, apenas para estar próximo de seus filhos. Ele nunca abandonou os presídios, senzalas, campos de guerra, favelas, escombros, o escuro sombrio do meu quarto... Ele nunca nos deixou à mercê do acaso. Sua presença comprova- se em seu amor e consolo entre os prantos do dia a dia, em sua escolha cega pelos excluídos e feridos dessa funesta guerra da vida. Deus não escolheu a dor, antes, sujeitou-se à mesma dor que nós escolhemos. Deus não escolheu a morte, porém entregou-se à morte destinada a nós. Essa é a prova incontestável, não somente de sua existência; além do imaginável, é o veredito da sua compaixão... Certo disso, em partida para a cruenta luta à sua espera, o soldado encerra sua oração: “Juro, porém: já não receio a morte”.

Castro Lins



Para onde me irei do teu Espírito, ou para onde fugirei da tua face?
Se subir ao céu, lá tu estás; se fizer no inferno a minha cama, eis que tu ali estás também.
Se tomar as asas da alva, se habitar nas extremidades do mar, até ali a tua mão me guiará e a tua destra me susterá.( salmo 139)



Em qualquer lugar no espaço, Deus permanece com seus filhos... ainda que soterrados entre os escombros de um terremoto. Deus Abençoe o Haiti!

22/01/2010

sábado, 9 de janeiro de 2010

VIVOS

A morte roubou lágrimas de Deus! Jesus chorou ao ver o sepulcro do amado Lázaro. A vida roubou lágrimas de um homem, foi quando a morte se fez mais preferível que a vida; todavia, da vida sabemos da dor pertinente a ela, da morte nada sabemos... essa relação, para alguns, é um risco sensato, daí a morte é uma aposta no mínimo coerente.

Em dias de fome e desigualdade entre os homens, uma mulher foi impelida a prostituir-se para alimentar seus irmãos ainda crianças. Alguém lhe indagou com furor: “ o que te impede de lançar-te daquela ponte, para que o feroz rio recolha tua vida e leve em suas águas todo o teu sofrimento?” Ela chorava, e não sabia responder-lhe. Ele olhou para a velha cama ao seu lado e viu uma bíblia sobre os lençóis, de repente, já com as escrituras sobre as mãos, esse jovem homem insiste para com a moça imperativamente: “leia para mim sobre a ressurreição de Lázaro!” Assim ela o fez, e o capítulo chega ao fim com a seguinte e literal frase: Lá estava... “ uma prostituta e um assassino diante das Escrituras Sagradas.” Esse breve trecho do livro “Crime e Castigo” de Dostoiévski, mostra em sutilezas a violência e dor pertinente a vida. O jovem assassino teve sua resposta, não proveniente das palavras da mulher, pois talvez nem ela mesma sabia ao certo o que a sustentava viva. A resposta que ele procurava estava sobre a cama, bem ao seu lado.

Quando assolados pela sombra do suicídio, na busca do alivio das dores do mundo, percebo o quanto Deus é a única base solida, sustentáculo, que faz da vida ainda mais preferível que a morte. O alívio incerto que busca-se na morte, encontra-se, indesviavelmente, em Deus.

Jesus Atrai para si de braços estendidos e olhos fechados em amor... suicidas, prostitutas, assassinos, publicanos, ovelhas perdidas, pobres, doentes... Todos encontram nele o perdão de seus crimes, e consolo de suas almas torturadas brutalmente pela culpa. Todos inclusos, assentados ao redor das escrituras, como famintos em busca de pão numa mesa farta, como mariposas atraídas pela luz sedutora. “O cristianismo - ponderou Nietzsche - tomou o partido de tudo que é fraco, vil e malogrado...” Talvez suas mentes não saibam ao certo responder o que os sustenta vivos, mas convêm saber... que neles há vida mesmo cercados pela morte, marcham a caminho da felicidade mesmo em prantos.

A morte ainda hoje rouba lágrimas de Deus, no entanto Jesus trouxe Lázaro de entre os mortos, pois enfim Ele preferiu a vida, e acrescentou: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crer em mim ainda que morra viverá.” Depois de tanto procurar a resposta... agora sei o que ainda me mantem vivo!
Castro Lins